SEABRA, José Augusto. Fernando Pessoa e o texto jornalístico. O Estado de São Paulo, 27/06/1987. caderno Cultura, p. 1-2.
Análise de uma faceta pouco conhecida da multifacetada obra de Fernando Pessoa: sua experiência jornalística. Antes mesmo de participar da fundação da revista Orpheu, em 1915, iniciando o “Movimento Modernista” em Portugal, colaborava com a revista Águia, em 1912. Neste período escreveu, também, para O Jornal e participou ativamente das revistas Portugal Futurista (1917), Atena (1924), Revista de Comércio e Contabilidade (1926) e Presença (1927). Vale lembrar que esta experiência como jornalista se dá num momento de efervescência cultural. Foi com o heterônimo Álvaro de Campos, que o poeta investiu o seu entusiasmo jornalístico:
“Notícias desmentidas nos jornais,
Artigos políticos insinceramente sinceros,
Notícias passez-à-la-caisse, grandes crimes –
Duas colunas deles passando para a segunda página!
O cheiro fresco a tinta da tipografia!
Os cartazes postos há ouço, molhados!
Vients-de-paraître amarelos com tinta branca!
Como eu vos amo a todos, a todos, a todos,
Como eu vos amos de todas as maneiras,
Com os olhos e com os ouvidos e com o olfato
E com o tato (o que palpar-vos representa para mim!)
E com a inteligência como uma antena que fazeis vibrar!
Ah, como todos os meus sentidos têm cio de vós!”
Noutra oportunidade, o mesmo Álvaro de Campos evoca os poderes do jornalismo citando o jornal inglês The Times:
“Sentou-se bêbado à mesa e escreveu um fundo
Do times, claro inclassificável, lido,
Supondo (coitado!) que ia ter influência no mundo...
Santo Deus!... e talvez a tenha tido”.
Nestes dois textos o poeta faz “ao mesmo tempo o elogio e a crítica do jornalismo, traçando-lhe as ambições e os limites. As relações entre o jornalismo e a literatura são tratadas num texto em que, dialogicamente, conversa com um jornalista. Assim delineia a tese – de que é pressuposta a antítese – segundo a qual o jornalismo tem a ‘força mental da literatura’, pois literatura é. Com esta reserva (mental ainda): ‘como, porém, o seu fim não é senão ser literatura naquele dia, ou em poucos dias, ou, quando muito, numa breve época ou curta geração, vive perfeitamente conforme os seus fins’”.Fonte pesquisada:Materia transcrita do site Tirodeletra.com