TESE DOUTORADO
Quero lembrar que neste trabalho estão inceridos o pensamento de um Teólogo cristao, Karl Josef
Karl Rahner reflete.
Este trabalho quer tratar a liberdade cristã na ótica de Karl Rahner, o que implica o desafio de “libertar” o conceito de liberdade das reduções em que a palavra se encontra hoje aprisionada. Nesse sentido, “libertar” a liberdade significa retirar-lhe o peso do efêmero, que talvez seja a marca do homem da chamada pós-modernidade e que, no extremo, é o que escraviza impeditivamente o entendimento da liberdade cristã como “evento" do eterno.
Mas não é só. Cuidar da liberdade que é cristã implica perceber a liberdade como uma misteriosa experiência, por seu caráter indissociável da relação do ser humano com Deus. Por isso, a liberdade que pretendemos “descobrir” nessas linhas tem sua origem encoberta no “mistério absoluto a que chamamos Deus”.
Tal relação somente será entendida no contexto hodierno se perseguir o exato sentido que ora a presente página assim delimita:
a tarefa de pensar o cristianismo através da sua configuração na cultura plural parece-me fadada à superficialidade meramente morfológica do fenômeno cristão [...] se nós não nos perguntássemos pela idéia, ou pela essência, ou pelo ato que produz a forma ou a figura cristãs como absolutas. Ab-solutas, no sentido rigoroso do termo, isto é, livres da relação, livres na relação; livres, assim, para a livre relação. A proposta que o estudo persegue
Assim é que esse estudo encontra a liberdade como a realidade da experiência transcendental. É quando o sujeito experimenta a sua própria ação não como um evento objetivo, mas como um evento subjetivo, que o homem experiência um acontecer salvífico, na medida em que o exercício da liberdade não se reduz a uma escolha efêmera, mas implica o evento, cujo objeto valorado é o próprio homem. Nas palavras de Rahner,
quando se entende realmente a liberdade, compreende-se que ela não é a faculdade de fazer isto ou aquilo, mas a faculdade de decidir sobre si mesmo e construir-se a si mesmo.
É esta a perspectiva que faz do exercício da liberdade um evento salvífico e que, por isso mesmo, implica trazer a concepção de salvação para a concepção de criação. Em sua sabedoria, Rahner defende que o homem, quando se aceita real e serenamente como criatura, se aceita como ser da liberdade e da responsabilidade, como o ser da diferença entre o que ele é e o que deve ser. Essa diferença pede ao cristão uma superação e, portanto, “um ‘não’ a alguma coisa e um ‘sim’ a outra coisa, a uma coisa melhor."
Desse modo é no exercício da sua misteriosa liberdade que o homem, num tempo único que lhe é dado pelo Criador, vai-se construindo, na história, na superação da diferença entre um “não” e um “sim”, ou seja, “entre a preguiça do seu espírito e o seu egoísmo, por um lado, e a luz da verdade, do amor, da fidelidade e do desinteresse, por outro".
É diante disso que o tema da liberdade e o tema da criação se entrelaçam de tal maneira no cristianismo que se tornam indissociáveis na compreensão que se pretenda alcançar do que seja o homem.
A estrutura metodológica que se utiliza
Neste ponto impõe-se esclarecer a estrutura deste trabalho, que é marcada pelo entrelaçamento e pela complexidade de suas questões, porque assim nos impõe a realidade do cristianismo, tal como o percebeu o autor sob estudo. Por isso, não perseguir esta complexa trama incorreria cair numa “temível simplificação”, conforme a advertência de Rahner:
Quem leva em consideração apenas uma parte dentro de um estado de coisas complexo, pode falar de um modo “claro”. Sua clareza, contudo, é tão-só a de um temível simplificateur (simplificador). Quando o objeto não permite que a sua realidade seja simplificada, é inevitável certa complicação na linguagem.
Rahner recomenda ao leitor que vá penetrando na trama das reflexões que ele reconhece, também lhe foram difíceis. A ressalva é pertinente porque se observarmos os capítulos que se apresentam, poderia parecer que seus títulos, por si, apontam uma impermeabilidade, apontam uma seqüência estanque em que o primeiro traria a liberdade como mistério do Pai; o segundo trataria a liberdade como um evento salvífico e, portanto, discorreria sobre o Filho; e o terceiro encerraria a segunda parte, apresentando a missão do Espírito Santo, na autocomunicação de Deus ao ser humano.
Tal não corresponde ao que se pretende porque como nos diz a clareza de Rahner, “assim não pode ser]. E não pode mesmo, pois quando “o Pai se nos dá a si próprio em absoluta autocomunicação mediante o Filho no Espírito Santo”, aí, está dada a experiência da “Trindade da história da salvação e revelação, e na qual fazemos a experiência da Trindade imanente”, ou seja, de como a Trindade é em seu ser mais íntimo, donde este trabalho pressupõe a ação da Trindade desde aqui e por todas as linhas até a conclusão, que melhor exporá a premissa trinitária que desde já se expôs.
Dito isso, é a partir da afirmação de que a liberdade não se pode dissociar do tema da criação, que esta Primeira Parte luta por dar significado a uma teologia da criação que responda alguns problemas cruciais que desafiam a fé cristã – individual ou coletivamente –, no que tange à concepção de Deus, de ser humano e o papel desempenhado pela liberdade diante de ambos.
Nesse sentido, será impossível reter a Primeira Parte apenas na análise da Primeira pessoa trinitária, ou seja, o Pai, uma vez que o cristianismo se funda na Revelação do Filho, que nos deixa seu Espírito, para que possamos atualizar a mensagem cristã de modo a que ela alcance os “confins do mundo”, sob a inspiração do Espírito de Jesus Cristo. Nesta Parte, desponta a liberdade como o mistério fundamental da relação entre Deus Pai e o ser humano, com o quê se espera tirar conseqüências do pensamento rahneriano para a experiência e a vivência cristã nos dias que correm.
Na mesma linha, se o título pode sugerir que a Segunda Parte se exaure no exame da Segunda pessoa, ou seja, no Filho, o estudo mostrou-nos, de novo, o papel da liberdade de Deus Pai que quer revelar-Se por seu Filho, e nisso revela-Se por nosso Redentor. As implicações dessa revelação redentora, para a teologia da criação de nosso autor, desembocam no caminho de questões tais como o conhecimento de Deus, o encontro com o Deus homem e o significado a se atribuir ao mundo, à história e ao tempo, diante do misterioso evento salvífico que se dá na liberdade absoluta da autocomunicação de Deus pelo Logos.
KARL RAHNER. Curso fundamental da fé: introdução ao conceito de cristianismo, 2ª ed. SP: Paulus, 1989, 121. As próximas referências ao autor se farão como RAHNER e a esta obra pela abreviatura CFF.
VÁZQUEZ MORO. A configuração do cristianismo numa cultura plural, Perspectiva Teológica, Belo Horizonte, no 70, 363-364, set./dez. 2003..
RAHNER. In Publik-Forum, 23 de fevereiro de 1979, nº 4, 13. Apud H. VORGRIMLER. K. Rahner: experiencia de Dios em su vida y en su pensamiento. Santander: Sal Terrae, 2004, 23. Tradução brasileira: Karl Rahner: experiência de Deus em sua vida e em seu pensamento. SP: Paulinas, 2006, 25-6. As próximas referências a esta obra se farão pela abreviatura EDV, segundo a edição em Espanhol.
RAHNER. O Deus Trino, fundamento transcendente da história da salvação. Mysterium Salutis II/1, Petrópolis:Vozes, Cap. 5, seção I, 290. As próximas referências a este artigo se farão pela abreviatura. GOS CATÓLICOS, PROTESTANTES E ORTODOXOS.
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