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domingo, 9 de junho de 2024

FACULDADE E SEMINÁRIO TEOLÓGICO NACIONAL 02

                                    FACULDADE E SEMINÁRIO TEOLÓGICO NACIONAL

 
























TÍTULO DO TCC: 

                                                      BIBLIA E EVANGELIZAÇÃO


                                                  MINISTÉRIO PASTORAL FEMININO








NOME DO ALUNO:VALDECI FIDELIS












SÃO LOURENÇO – MG


2018

NOME DO ALUNO:VALDECI FIDELIS


 







TÍTULO DO TCC

                                       A BIBLIA E EVANGELIZAÇÃO




FACULDADE E SEMINÁRIO TEOLÓGICO NACIONAL

 




                                                            TCC ; apresentado ao Curso de Mestrado em

                                                 Teologia Livre da Faculdade e Seminário Teológico 

                                                         Nacional, como requisito parcial para a 

                                                  obtenção do título de Mestre em teologia livre. 

                     Sob a orientação do Prof. Dr. Edson Marques.


















 



                                              

                             

                                                 SÃO LOURENÇO-MG  2018

 







SÃO LOURENÇO – MG

2018







 



 





Faça o Sumário após finalizar o trabalho, visto que você o preencherá de acordo com as

páginas e capítulos desenvolvidos.


SUMÁRIO



1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................ 4

2 TEXTOS PAULINOS RELEVANTES SOBRE O MINISTÉRIO

   PASTORAL FEMININO.................................................................................................................. 5

     2.1 GÁLATAS 3.26-29............................................................................... ....................................5

     2.2 I CORÍNTIOS 11-14............................................................................. ....................................8

     2.3 I TIMÓTEO 2.8-15..................................................................................................................15

3 UMA PROPOSTA TEOLÓGICA PAULINA PARA O MINISTÉRIO

   PASTORAL FEMININO................................................................................................................ 20

     3.1 A TEOLOGIA PAULINA DAS DUAS ERAS...................................... ..................................20

     3.2 A VIVÊNCIA DA IGREJA NAS DUAS ERAS.................................... ..................................21

     3.3 A POSSIBILIDADE PAULINA DO MINISTÉRIO PASTORAL

           FEMININO............................................................................................................................ 30

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS......................................................................................................... 33

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.............................................................................................. 35





1    INTRODUÇÃO



                   O assunto Bíblia e evangelização imbuída de caráter essencialmente móvel dinâmico desbravador que é inerente a Deus quem revela a missão do Ide e pregai o Evangelho. Mas “ministério pastoral feminino” é extremamente polêmico no movimento evangélico brasileiro. Na Convenção Batista Brasileiro, por exemplo, existe uma ferrenha discussão hoje sobre o assunto. Em 2012, em sua assembleia anual, a Ordem dos Pastores Batistas do Brasil deliberou que pastoras podiam filiar-se à Ordem, mas que, em cada Secção Estadual os pastores filiados decidiriam sobre a aceitação ou não de pastoras (CINTRA, 2015). A mesma discussão ocorre nas igrejas históricas, pentecostais e neopentecostais. A disputa entre tradicionais (os que não aceitam pastoras) e igualitários (os que aceitam) está muito acirrada, tanto no campo bíblico como no ético-social. Teólogos têm se manifestado sobre o assunto e, como é de praxe, divididos (neste TCC, Culver, Foh, Lopes e Grudem são contrários; Liefeld e Mickelsen são favoráveis).

                   Para os que creem na inspiração divina e inerrância da Bíblia, a última palavra deve vir dela. O exame das Escrituras, nos textos acerca deste assunto, e a consequente teologia derivada devem levar os cristãos a um posicionamento sobre a possibilidade ou não deste tipo de ministério pastoral. Este Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) parte do pressuposto de que toda a Bíblia é inspirada por Deus, que a Escritura deve interpretar a Escritura, sempre com o uso da razão e que o apóstolo Paulo é o autor das treze cartas que levam seu nome no Novo Testamento.

                   Na Bíblia, o apóstolo Paulo é o escritor que mais se manifesta sobre o assunto. Pelo volume de sua escrita e pelo conteúdo teológico que provem de sua pena, Paulo é o escritor bíblico mais citado, tanto a favor quanto contra o ministério feminino. Por este motivo, este TCC tem como escopo estudar o pensamento paulino acerca do assunto. Num primeiro momento, se trabalhará as interpretações e análises de importantes textos paulinos sobre o assunto e, num segundo momento, uma proposta de teologia paulina acerca da possibilidade do ministério pastoral feminino.





2    TEXTOS PAULINOS RELEVANTES SOBRE O MINISTÉRIO PASTORAL FEMININO



                   O apóstolo Paulo é o grande formulador teológico do Novo Testamento. Numa visão tradicional, ele escreveu treze cartas. Através destes escritos, é possível entender muito do pensamento cristão, pois encontramos neles a base da fé. No entanto, Paulo não escreveu tratados de teologia. 

Ele simplesmente escreveu a igrejas e pessoas tão somente para orientar acerca de problemas que eles estavam enfrentando. Ele constrói sua teologia a partir de problemas práticos e dá respostas a estes problemas em seu tempo e sua época, mas também formula, além da doutrina, princípios teológicos que valerão para todo tempo e época.

                   Em relação ao assunto ministério pastoral feminino, o apóstolo Paulo formula princípios gerais e universais que nivelam homem e mulher na nova ordem de salvação criada por Jesus e vivenciada na Igreja; nesta nova ordem, todos os dons são dados pelo Espírito Santo a todos os crentes, independente do gênero. Em alguns assuntos, ele teve que adaptar estes princípios às condições culturais de sua época. Três destes assuntos são: a monogamia/poligamia, a escravidão e a liderança pastoral feminina na igreja. Neste sentido, Paulo tanto reafirmou a prática cultural de sua época quanto deu margem para uma mudança de postura em virtude de mudança de cultura, rumo aos princípios gerais e universais expostos em outros textos.

                   Há três textos relevantes sobre assunto que convém analisar: Gálatas 3.26-29, I Coríntios 11-14 e I Timóteo 2.8-15. Outros textos paulinos serão mencionados, mas estes três constituem a base para uma definição acerca do assunto.



2.1 GÁLATAS 3.26-29

                  


                   A carta aos gálatas foi escrita com o propósito de evangelizar que a salvação é exclusivamente pela fé em Jesus Cristo. Pregadores judaizantes estavam ensinando que, além da fé em Jesus, era necessária também a obediência da lei de Moisés, inclusive com o rito da circuncisão. A defesa de Paulo do seu evangelho é vigorosa no sentido da evangelização. No capítulo 3, ele ensina que a promessa foi dada a Abraão porque ele creu em Deus (v. 6) Sabeis, pois, que os que são da fé em Jesus, esses são filhos de Abraão (v. 7). Isto só tornou-se possível porque Cristo nos resgatou da maldição da lei ao morrer no madeiro, conforme determinação da lei (v. 13,14). Pela fé, os gentios recebem a Cristo e a promessa do Espírito. A lei foi dada por Deus para servir como um aio, tutor, até que a vinda de Jesus pudesse levar os homens a crer nele. Neste argumento, ele desenvolve o texto de 3.26-29.

                   Nos v. 26,27, ele diz: “pois todos sois filhos de Deus pela fé em Cristo Jesus. Porque todos quantos fostes batizados em Cristo de Cristo vos revestistes” (edição Revista e atualizada 2ª edição João Ferreira de Almeida Sociedade Bíblica Brasil, em todo o trabalho). Através da fé, todos são filhos de Deus. A palavra “todos” não deixa dúvida de que qualquer pessoa, independente de qualquer condição humana, pode ser salva e desfrutar deste privilégio. O batismo é o sinal desta nova situação e indica que todos se vestiram de Cristo, ou seja, são novas criaturas modeladas segundo seu Senhor. A fé em Cristo produziu um novo modo de ser e viver, então não se firma a condição de se proibir a mulher do ministério pastoral embora queira que ela continue vivendo na velha era. A doutrina da salvação pela fé não ficava restrita ao campo doutrinário, metafísico, mas passava a fazer parte da vida prática, do dia a dia, pois “se alguém está em Cristo, nova criatura é” (II Coríntios 5.17). Porque, sendo livre de todos, fiz-me escravo de todos, a fim de ganhar o maior número possível. (1 Coríntios 9.19)

                   No v. 28, há a declaração de Paulo dizendo que: “não pode haver judeu nem grego; nem escravo nem livre; nem homem nem mulher; porque todos vós sois um em Cristo Jesus”. O apóstolo coloca alguns pares divididos por raça, meio social e natureza. O primeiro par lembra a divisão racial que existiu em toda a história do povo de Israel de se considerar o “povo eleito” e, desta forma, diferenciar-se de todos os outros povos. Na fé em Cristo, não existe mais raça (nacionalidade) escolhida. O segundo par é formado pelas normas da sociedade: escravos e livres. Esta divisão social nada significa na fé. Para a época, esta é uma ideia revolucionária já que a prática da escravidão estava enraizada em todo o mundo antigo. “O terceiro par vem da natureza: “macho” e “fêmeo”, palavras que se caracterizam por definir a sexualidade de cada indivíduo humano. Homens e mulheres ocupam o mesmo patamar na presença de Cristo. Não há mudança humana e externa na vida destas pessoas: o homem continua sendo homem, igualmente a mulher, o escravo continua sendo escravo. Tudo continua sendo absolutamente igual na sociedade. Isto faz parte da teologia paradoxal de Paulo do “já” e do “ainda não” em relação à salvação operada por Cristo que se manifestava numa era atual e na era vindoura simultaneamente. Mas, no que envolve a fé em Cristo, e isto envolve a Igreja, todas estas distinções humanas se rompem e estas pessoas são totalmente niveladas em Cristo. Todas elas tornam-se um em Cristo. Ou seja, não apenas são niveladas como também são unidas a ponto de ser um só povo na pessoa de Cristo. A unidade da humanidade é conseguida e vivenciada em Jesus Cristo.

                   Ainda em relação ao v. 28, Lopes (2015, p. 5-7) não vê neste texto a abolição da subordinação feminina e de igualdade de funções no ministério pastoral. Argumenta com quatro oposições à utilização deste texto para o ministério pastoral feminino. A primeira oposição diz respeito ao objetivo do texto que é tratar da nossa posição diante de Deus quando cremos em Cristo e não das funções que homens e mulheres desempenham na Igreja. A segunda é que Paulo enraíza a subordinação feminina, não na queda, mas na própria criação. A terceira oposição diz respeito à palavra “um” no texto que significa unidade de todos em Cristo e não igualdade de funções. A quarta objeção é que Cristo não aboliu, na presente era, os efeitos do pecado e os castigos quando pecaram. A primeira e a terceira objeções são textuais. De fato, o texto fala da nossa posição em Cristo que nos foi dada mediante nossa fé nele. A questão é se esta nova posição não traz implicações de caráter prático para a relação homem-mulher. Se, em Cristo, não há homem nem mulher, será que, em Cristo, a mulher permanece subordinada ao homem? Será que, em Cristo, o escravo permanece subordinado ao livre? Ou o grego ao judeu? Paulo está lançando um princípio novo decorrente da posição que os crentes têm em Cristo, qual seja, esta nova posição acabou com as diferenças e os igualou. A aplicação disto nas diversas sociedades se dará conforme as culturas de cada uma delas, mas o princípio está dado e afetará a questão da evangelização do ministério pastoral feminino nas culturas onde isto couber. Em relação à unidade, segue-se o mesmo pensamento, pois não pode haver unidade com subordinação entre as pessoas envolvidas. A segunda e a quarta objeções não são textuais. A ideia de que a subordinação da mulher ao homem começou no Éden ou na queda é muito discutida na teologia e não há pensamento único acerca deste assunto entre os teólogos que creem na inspiração das Escrituras. Se, de fato, Cristo não aboliu, na presente era, os efeitos do pecado, também é certo que ele iniciou uma nova era cujos propósitos podem, dentro das possibilidades culturais, ser vividos nesta era presente. Se a cultura permite à Igreja vivenciar na prática o “nem homem nem mulher em Cristo” nesta era, por que não se viveria?

                   No v. 29, se as pessoas são de Cristo, logo são as sementes prometida por Deus a Abraão e herdeiros de todas as bênçãos desta promessa. Não há diferenciação nestes privilégios entre uns e outros, entre homens e mulheres.

                   O texto de Gálatas 3.26-29, por ser doutrinário e trazer princípios relativos à salvação em Jesus Cristo é um texto que deve governar outros textos que indiquem aparentes contradições com este ou demonstrem fatos locais e culturais, pois:


Esta é uma passagem crucial que tende a citar como a que governa a interpretação de todos os demais textos relevantes, ou ao contrário, a ser minimizada quanto às suas implicações. [...] Gálatas 3:28 deve ser visto como um contraste com o status inferior geralmente dado às mulheres nos dias de Paulo. É uma afirmação dramática que não deve ser desprezada, nem diluída com o objetivo de manter uma posição restritiva. Gálatas 3.28 aplicam-se a relacionamentos sociais dentro da igreja, e não meramente ao âmbito espiritual da soteriologia. Ao mesmo tempo, não significa que todas as distinções estão eliminadas. Nem uma declaração positiva como Gálatas 3.28, nem uma restritiva, como I Timóteo 2.12, devem ser consideradas à parte da revelação bíblica total sobre o assunto (LIEFELD, 1996, p. 166,168).


Mickelsen (1996, p. 250), seguindo nesta mesma linha de pensamento, escreve que:

O erudito do Novo Testamento, F. F. Bruce declarou em seu comentário de Gálatas 3.28: “Paulo estabelece aqui o princípio básico: se as restrições sobre esta questão se encontrarem noutras passagens das cartas paulinas (...), essas terão de ser entendidas em relação a Gálatas 3.28, e não vice-versa”.


                  




3    UMA PROPOSTA TEOLÓGICA PAULINA PARA O MINISTÉRIO PASTORAL FEMININO



3.1 A TEOLOGIA PAULINA DAS DUAS ERAS



                   A teologia paulina vê o evento “Cristo”, principalmente sua morte e ressurreição, como o centro da ação de Deus na história (I Coríntios 15.3,4; 2.2; Romanos 6.4-10; Gálatas 2.20; 4.4-6). Como rabino judeu, Paulo entendia que a época presente era controlada pelo mal, mas que viria uma época vindoura que começaria com o Dia do Senhor e na qual Deus instalaria o seu Reino em definitivo na Terra, vencendo todo o mal. “Saulo, o judeu, participava da esperança judia da vinda do Messias, de uma forma ou de outra, para destruir seus inimigos, redimir Israel e estabelecer o Reino de Deus” (LADD, 1985, p. 343). Quando Paulo converte-se a Jesus no caminho de Damasco (Atos 9.1-19) seu pensamento acerca das eras presente e vindoura muda, em especial, porque ele passa a crer em Jesus como o Messias. Logo, a era messiânica já havia iniciado. Segundo Ladd (1985, p. 343-352), para Paulo, a atual era/século (grego: aion) era caracterizada pelo domínio do pecado e estava em rebelião contra Deus, sendo dominado pelo seu deus, Satanás (II Coríntios 4.4). Com a vinda de Jesus, o Messias, seu Reino já estava na Terra e foi trazido ao seu povo, mesmo que o mundo não o pudesse perceber (Colossenses 1.13). O reinado de Jesus não começaria na parousia (vinda) e se estenderia ao tê-los (fim), mas começou na sua ressurreição e iria até o tê-los. Desta forma, a partir de Jesus Cristo, a era (aion) vindoura entrou na história humana. Embora a era vindoura ainda esteja por vir, seu poder e suas bênçãos invadiram a presente era das trevas. Os que creem em Jesus passam a viver em duas eras simultaneamente. Precisam viver neste mundo, dentro de suas culturas com suas responsabilidades e, ao mesmo tempo, são a comunidade do Senhor que desfruta da nova vida em Cristo: “pelo que, se alguém está em Cristo, nova criatura é; as coisas velhas já passaram; eis que tudo se fez novo” (II Coríntios 5.17). Uma nova vida está aberta aos homens: a existência “em Cristo”.

Ele agora sabia que Jesus é o Messias, o Filho de Deus, que inaugurou uma nova era, que requeria de Paulo uma nova atitude diante dos homens. Ele não os via mais como judeus e gregos, escravos e livres. Tais distinções, embora reais, não mais interessavam. Todos eles são homens amados por Deus, por quem Cristo morreu a quem ele tem que levar as boas novas da novidade da vida em Cristo (1985, p. 351).


Qual então é centro da teologia paulina?


A teologia de Paulo é a exposição dos novos fatos redentores; a característica comum, em todas as suas ideias teológicas é o seu relacionamento com o ato histórico de Deus da salvação em Cristo. O significado de Cristo é a inauguração de uma nova era de salvação. Na morte e ressurreição de Cristo, as promessas da salvação messiânica do Velho Testamento se cumpriram, mas dentro da era antiga. O novo veio dentro do alicerce do antigo; mas o novo também está destinado a transformar o antigo. Portanto, a mensagem de Paulo é tanto de uma escatologia realizada como futurística (1985, p. 352).

                  

                   A nova era, ou o Reino de Deus, que Jesus trouxe cria a Igreja como a comunidade do Reino. A Igreja está inserida nas comunidades da velha era e com elas terá de conviver. Mas a Igreja, em si, é uma comunidade totalmente diferente porque ela é escatológica. Ela pertence ao futuro; na verdade, é a comunidade dos remidos que habitarão o céu: “mas a nossa pátria está nos céus, donde também aguardamos um Salvador, o Senhor Jesus Cristo” (Filipenses 3.20). É nesta tensão que a Igreja vive: ela é a comunidade da nova era que Cristo iniciou, mas, ao mesmo tempo, ela tem que viver na velha era com seus costumes, tradições e comportamentos derivados tanto da imagem de Deus que ele colocou na humanidade (Atos 17.25-29) quanto da queda (Romanos 1.28-32).

                       Muita igreja e ministério ainda existem certo preconceito a respeito da teologia por parte de muita gente nas igrejas, especialmente entre o povo evangélico, de que "estudar demais torna as pessoas criticas ou céticas" existem muitos casos de colegas que abandonaram o estudo por não conseguirem aceitar as diferentes visões nas quais excluem as mulheres como pastoras somente ao homem este direito. Paulo ver o caminho para o pastorado não no singular, mas como plural, mas pode variar conforme a vertente de alguma igreja.


 3.2 A VIVÊNCIA DA IGREJA NAS DUAS ERAS



                   A Igreja, esta comunidade em tensão, terá duas tarefas em sua caminhada nesta terra. A primeira é viver os princípios da nova era que Cristo trouxe com os valores da ética do Reino de Deus. Um dos princípios é que a principal virtude ética e existencial que Jesus ensinou e que Paulo salienta é o amor (I Coríntios 13; Romanos 12.9-10; 13.10; Gálatas 5.6; Efésios 5.2; Filipenses 2.2; Colossenses 3.14; I Tessalonicenses 3.12; I Timóteo 1.5; Tito 2.2; Filemom 5). O amor rege todas as demais virtudes, mas este amor é constantemente qualificado, como em I Coríntios 13.4-7. Existem outros princípios que pertencem a esta nova era como o de Gálatas 3.28 onde, em Cristo, não há homem, nem mulher; nem escravo, nem livre; nem judeu, nem grego. Este é um princípio da nova era de Cristo, do Reino de Deus, e isto é fácil de perceber: no céu (a consumação plena da nova era de Cristo), nenhuma destas diferenciações fará sentido, pois “todos sois filhos de Deus pela fé em Jesus Cristo” (Gálatas 3.26). Cabe à Igreja perseguir estes princípios na sua prática de vida, os quais são superiores a qualquer cultura que o homem crie.

                   A segunda grande tarefa da Igreja consiste em, tendo estes princípios superiores como objetivos, viver na sua cultura separando o que é bom e o que é mal dentro dela. Diz Paulo em I Tessalonicenses 5.21-22: “mas ponde tudo à prova. Retende o que é bom; abstende-vos de toda espécie de mal” e em Filipenses 4.8: “quanto ao mais, irmãos, tudo o que é verdadeiro, tudo que é honesto, tudo que é justo, tudo que é puro, tudo que é amável, tudo que é de boa fama, se há alguma virtude, se há algum louvor, nisso pensai”. Estes dois textos, entre outros, servem para demonstrar que Paulo entendia que há coisas boas e más nas culturas e competia aos cristãos usar as Escrituras e a razão para discernir e, tanto aprovar como rejeitar, pois “não vos conformeis a este mundo, mas transformai-vos pela renovação da vossa mente” (Romanos 12.2).

                   Um problema difícil para a Igreja na execução destas duas tarefas é que o evangelho geralmente chega depois da cultura. As sociedades estão formadas com seus valores próprios, distantes de Deus e de sua vontade. O evangelho produz mudanças nos que creem (Efésios 2.11-13; Filipenses 1.5,6; I Tessalonicenses 1.5,6), mas em muitos aspectos, a noção de certo e errado, bem e mal, está atrelada àquilo que são os costumes de cada sociedade. Assuntos como alimentação, vestuário, formas de tratamento, diferenciação social, papéis do homem e da mulher, relacionamento familiar, entre outros, são parte da formação cultural de cada povo em cada época específica. O homem forma a cultura e é formado por ela. Assim, muito do que seja bem ou mal para um cristão estará atrelado ao que a sua sociedade lhe ensinou. Em contato com os princípios da nova era em Cristo, tensões aparecerão e a Igreja precisa da orientação inspirada dos escritores da Bíblia. Nem sempre, em toda a cultura, a Igreja conseguirá viver plenamente os princípios básicos da fé, mas terá de se amoldar até que a situação permita vivê-los.

                   A dificuldade em cumprir as duas tarefas da Igreja (viver os princípios bíblicos principais e separar, na cultura, o que é bem e mal) pode ser observado em três assuntos culturais sobre os quais Paulo fala: subordinação da mulher ao homem na igreja e na sociedade, a monogamia/poligamia e a escravidão. Todos estes assuntos faziam parte da vida das sociedades greco-romanas e judaicas da época do apóstolo Paulo.

                   Acerca da questão da monogamia/poligamia, Rega (2009, p. 66-70) apresenta o que ele chama de “situações críticas fronteiriças” (2009, p. 66). São situações cujo comportamento da sociedade destoa da ética do evangelho e, temporariamente, aceita-se aquele comportamento, mas tomando ações que visem uma futura mudança. Ele cita como situações assim, da época de Paulo, a poligamia e a escravidão. Acerca da poligamia, Rega afirma que os princípios bíblicos ensinam as famílias a serem unidas pelo amor (Colossenses 3:12-14). A palavra de Deus também protege as famílias por ensinar outro principio orientador: que o casamento deve ser permanente (Gn 2:24). Por seguirmos os princípios bíblicos, podemos proteger-nos em sentido material e emocional. Por exemplo, os padrões normalmente preferem empregados que seguem os princípios bíblicos da honestidade e da diligencia (Provérbios 10:4, 26; Hebreus 13:18). Na Palavra de Deus, somos ensinados a ficar contentes quando as nossas necessidades básicas são satisfeitas, Paulo nunca quis esperar ser dependente dos outros, ele dava valor a amizade com Deus, do as coisas materiais. 


Paulo, por exemplo, teve que lidar com situações complexas para a cultura da época. Ao tratar da questão do incesto (I Coríntios 5.1-5), sua resposta foi radical: expulsão do incestuoso da comunhão da igreja. Em outra ocasião, no entanto, Paulo teve de encontrar uma alternativa diferente. Foi o caso dos homens que, embora casados, tinham outra mulher. Essa situação era tolerável na cultura da época, mas esses homens estavam se convertendo e se integrando às igrejas. [...] No primeiro caso, Paulo procurou estabelecer uma liderança que servisse de modelo para as gerações futuras. A situação dos que se convertiam não podia ser imediata e radicalmente alterada – ainda que de natureza complexa à luz da compreensão matrimonial e familiar bíblica – sob pena de gerar sérias dificuldades à sobrevivência familiar. A abordagem de Paulo para esta situação está descrita nos critérios para a escolha dos presbíteros e diáconos da igreja. Paulo enfatiza que o líder deveria ser marido de uma só mulher (v. 1 Tm 3.2,12; Tt 1.6).[...] Por que Paulo teria mencionado este critério ao descrever o perfil para os líderes das igrejas? Será que a igreja abrigava entre os membros pessoas que praticavam a poligamia ou que viviam a forma disfarçada de concubinato? Embora não haja registros de situações como essas, D. A. Carson lembra que a poligamia era praticada especialmente pela aristocracia, e em algumas províncias. [...] Outra possibilidade dentro deste raciocínio é que a proposta de Paulo visava formar uma liderança que seguisse o padrão bíblico de vida, inclusive nas relações matrimoniais, ou seja, a liderança abandonaria práticas culturais que conflitassem com padrões bíblicos. Isso quer dizer que os convertidos em estado matrimonial aceito social e legalmente (poligamia ou concubinato, p. ex.) poderiam mantê-lo (1 Co 7.17-24), mas não lhes seria permitido ocupar função de liderança. Com isso podemos deduzir que Paulo possuía um ideal ético a ser perseguido: monogamia como padrão para o matrimônio. No entanto, havia uma situação real vivida (ou pelo menos hipotética): a poligamia (real ou disfarçada em concubinato), que se desejava eliminar, objetivando atingir, mais tarde, o ideal ético. Paulo levanta uma liderança modelo para ser seguida pelas gerações futuras. Ou seja, tolerou-se provisoriamente uma situação enquanto as bases para conquistar o ideal ético bíblico eram lançadas. (2009, p. 66-70) (grifos do autor).

                  

O texto de Rega demonstra que Paulo foi capaz de tolerar a possibilidade da poligamia para os novos cristãos devido à cultura deles, trabalhando para que, no futuro, a monogamia fosse o ideal matrimonial de todos.

                   Muitos autores, quando falam da submissão da mulher ao homem, buscam nos textos da criação (Gênesis 1 e 2) a razão para que seja assim para sempre. Nestes mesmos textos, há a ordem de Deus para a monogamia (Gn 2.24). Este sempre foi o ideal de Deus para o matrimônio. Os homens construíram sociedades onde a poligamia imperava (basta ler o livro de Gênesis). No entanto, apesar de ter dado seu ideal no Éden, Deus tolerou este “desrespeito” ao seu padrão, respeitou as culturas e, ainda por cima, usou para sua revelação homens polígamos, como foi o caso de Abraão, Jacó, Davi e Salomão, entre outros. É de se destacar que o povo eleito de Israel foi formado de um homem chamado Jacó que tinha duas esposas e duas concubinas e, com elas, formou as 12 tribos da nação através da qual Deus se revelaria ao mundo (Gênesis 35.23-26). Na época de Paulo, havia a poligamia como algo natural em algumas sociedades e grupos. Paulo trabalhou para mudar esta situação em favor da monogamia (I Coríntios 7.2; Efésios 5.22,24; I Timóteo 3.2), mas sabia que estava “lançando as bases para conquistar o ideal ético bíblico”.

                   Outra questão cultural que conflitava com o ensino bíblico era a escravidão. Ao passo que a poligamia era exceção no mundo greco-romano e judaico, a escravidão era endêmica, pois “a escravidão era universal e inseparável da textura da sociedade. Tem-se estimado que, no tempo de Paulo, havia tantos escravos, quantos homens livres em Roma e a proporção de escravos para homens livres, na Itália, eram de três para um” (LADD, 1985, p. 490). Qual o princípio bíblico pressuposto nos textos da criação? A de que todo ser humano é livre porque cada um foi criado à imagem de Deus (Gênesis 1.27). Além disso, a ordem divina é que homem e mulher deveriam dominar a natureza e os demais seres: “enchei a terra e sujeitai-a; dominai sobre os peixes do mar, sobre as aves do céu e sobre todos os animais que se arrastam sobre a terra” (Gênesis 1.28). Em nenhum lugar é dito que eles deveriam dominar outros seres humanos. As sociedades formadas pelos homens produziram culturas favoráveis à escravidão. Assim, a escravidão tornou-se um costume cultural do mundo antigo e o era na época de Paulo.

                   Em I Coríntios 7.21-24, Paulo assim se manifesta com respeito ao assunto:

Foste chamado sendo escravo? Não te dê cuidado; mas se ainda podes tornar-te livre, aproveita a oportunidade. Pois aquele que foi chamado no Senhor, mesmo sendo escravo, é um liberto do Senhor; e assim também o que foi chamado sendo livre escravo é de Cristo. Por preço fostes comprados; não vos façais escravos de homens. Irmãos, cada um fique diante de Deus no estado em que foi chamado.


O chamado ao qual ele se refere é a conversão a Jesus Cristo. O que a pessoa era na sociedade, devia continuar a ser. Apesar de saber que a liberdade é um valor superior provindo do próprio Deus, Paulo nunca falou contra a escravidão e nunca incitou os escravos cristãos a se rebelarem. Pelo contrário, quando o escravo fugitivo Onésimo se converteu através de sua pregação, Paulo o mandou de volta ao seu senhor (Filemom v. 12). A ordem é: se você se converteu sendo escravo, continue escravo e não se preocupe com isto (v. 21). No entanto, como a liberdade é uma forma superior e melhor de vida, ele diz que, se o escravo tem uma oportunidade, legal e cultural, de tornar-se livre, deve aproveitá-la (v. 21). Para Paulo, um cristão tornar-se um escravo de homens, era inaceitável, pois já havia sido comprado por preço (v. 23): deveria permanecer livre. No v. 22, Paulo faz a compensação ao escravo cristão que se mantém como tal: “pois aquele que foi chamado no Senhor, mesmo sendo escravo, é um liberto do Senhor; e assim também o que foi chamado sendo livre escravo é de Cristo”. No Senhor, o escravo não é mais escravo, é um homem livre. A sociedade ainda o acorrenta, mas em Cristo tudo é conforme os mais altos princípios de Deus. Mesmo não rompendo, naquele momento, com a escravidão, Paulo lança uma base que iria fermentar a Igreja e a sociedade em relação a este fenômeno.

                   Outro momento em que Paulo fala mais detidamente sobre o assunto é em sua carta a Filemom. Paulo estava em uma prisão em Roma (v. 9,13). Paulo evangelizou e converteu um escravo fugitivo chamado Onésimo (v. 10). Paulo soube que o senhor de Onésimo era Filemom, outro discípulo que ele havia ganhado para Cristo (v. 19). Escreve uma carta a Filemom para dizer que envia Onésimo de volta, agora como um escravo útil (v. 11). São preciosas as palavras que Paulo usa acerca da forma como Filemom deve receber seu escravo Onésimo:

Porque bem pode ser que ele se tenha separado de ti por algum tempo, para que o recobrasses para sempre, não já como escravo, antes, mais do que escravo, como irmão amado, particularmente de mim, e quanto mais de ti, tanto na carne como também no Senhor (v. 15,16).


É certo que Paulo não falou contra a escravidão, mas o que ele estava fazendo ao dizer a um senhor de escravos que deveria tratar um escravo fugitivo “não já como escravo, antes, mais do que escravo, como irmão amado” senão destruir toda a base ideológica cultural da escravidão? No entanto, quando apela neste sentido a Filemom, o argumento de Paulo é que Onésimo é agora um “irmão amado”, ou seja, todos eles estão “em Cristo”. “A salvação de Jesus trouxe um nivelamento de todas as pessoas como irmãos (a nova era de Cristo), embora eles continuassem a ser senhor e escravo na sociedade (a velha era), pois”:

A fé cristã é para ser vivida dentro dos contextos das estruturas sociais existentes, pois elas pertencem à forma deste mundo, que passará (I Cor. 7.31) [...] Não há nenhuma palavra para libertar o escravo. No entanto, dentro do relacionamento da Igreja, tais distinções sociais foram ultrapassadas (I Cor. 12.13; Gál. 3.28), embora não pudessem ser evitadas na sociedade (LADD, 1985, p. 491).


                   Para quem lê literalmente o Novo Testamento, Paulo é a favor da escravidão e quer que os escravos continuem nesta condição: “foste chamado sendo escravo? Não te dê cuidado” (I Coríntios 7.21); “porque bem pode ser que ele se tenha separado de ti por algum tempo, para que o recobrasses para sempre” (Filemom 15); “vós, servos, obedecei a vossos senhores segundo a carne, com temor e tremor, na sinceridade de vosso coração, como a Cristo” (Efésios 6.5); “vós, servos, obedecei em tudo a vossos senhores segundo a carne” (Colossenses 3.23). Este é o perigo de ler literalmente as Escrituras sem aprofundar-se nos conceitos que ela expressa. Aquele que percebe que Jesus Cristo veio para inaugurar o seu Reino (que é uma nova era onde habita a justiça, o amor, a paz, a misericórdia, a solidariedade, o respeito, a liberdade), e que este se sobrepõe às culturas humanas, perceberá que determinados mandamentos bíblicos estão atrelados a suas épocas e sociedades e devem ser interpretados de acordo com os princípios maiores do Reino. Ridderbos assim se manifesta sobre o tratamento que Paulo dá à escravidão:

Por certo, fica aparente aqui que Paulo não pensava na abolição da escravatura como instituição por motivos cristãos. [...] Pode-se observar pelo simples fato de Paulo dirigir-se sucessivamente aos escravos e senhores como membros iguais da igreja e descrever o relacionamento entre eles como sendo de responsabilidade mútua, o quanto esta postura significou uma revolução. De maneira alguma ela podia ser conciliada  com a posição do escravo no mundo daquela época e nem dentro do judaísmo. [...] Não se pode negar que, ao mesmo tempo, foi introduzida uma enorme tensão na escravidão como sistema social, mas ainda assim, isso deve ser visto, tanto quanto podemos entender, mais como uma consequência do que como um objetivo deliberado das admoestações de Paulo (RIDDERBOS, 2014, p. 348).


                   A questão da subordinação da mulher nos escritos de Paulo segue a mesma linha do que foi dito acerca da poligamia e da escravidão. Ele segue a ideia básica de que os cristãos (a Igreja) vivem em duas eras ao mesmo tempo: a nova era inaugurada por Cristo, o seu Reino, e a antiga era dominada pelos efeitos da queda no Éden. Em Romanos 5.12-21, ele denomina esta situação entre os que estão “em Cristo” e os que estão “em Adão”. Adão aqui não é apresentado como o homem da criação no Éden, mas aquele através de quem o pecado entrou no mundo e passou esta condição a todos os homens (v. 12). Estar em Adão é ser pecador e estar debaixo dos efeitos da queda. Estar em Cristo é ser constituído justo por ele (v. 19) e reinar em vida por meio dele (v. 17).

                   Em primeiro lugar, Paulo estabelece o princípio de igualdade das mulheres em relação aos homens, decorrente da nova era da salvação. Textos como Gálatas 3.28 e I Coríntios 13, são emblemáticos neste sentido. Da mesma forma como Jesus estabeleceu uma hierarquia de valores colocando o amor e o respeito ao próximo em primeiro lugar (Mateus 22.35-40; 7.12), Paulo mostra os valores do Reino de Deus como importantes para a vivência da Igreja. Ela já vive na salvação de Deus e julga a cultura de acordo com estes padrões. Por conta de também viver na presente era, a Igreja tanto se adaptará à sociedade onde se encontra como também promoverá mudanças dentro dela.

                        A quebra de todas as diferenças sociais em Cristo tem um profundo impacto nesta mesma sociedade. Como já foi dito, os papéis sociais de Gálatas 3.28 continuam os mesmos, mas aconteceu uma mudança interna, tanto nas pessoas que participam desta fé, quanto no grupo que elas passam a integrar dentro da sociedade, que é a Igreja cristã. A fé em Jesus vai dizer que judeus e gentios são iguais neste Reino que pertence ao Senhor. Vai dizer que, em Cristo, todos são livres, embora temporalmente, alguns continuem escravos. Vai dizer que, embora continuem com a sexualidade que a natureza lhes deu, são agora iguais e não há mais superioridade de uns em relação a outras. Com o crescimento da Igreja cristã e sua influência, chegou o tempo em que as próprias sociedades humanas se apegariam aos princípios advindos desta doutrina e fariam uma declaração universal dos direitos humanos, aboliriam a escravatura, instituiriam o voto universal e a democracia, nivelariam a mulher ao homem com todos os direitos inerentes, etc. Não é à toa que todas estas conquistas se deram em países de tradição cristã. O princípio de Paulo diz respeito à Igreja, mas sem dúvida seria um avanço também para as sociedades por ela influenciadas. Esta visão de Paulo mudaria as sociedades. A grande tragédia para o cristianismo é que sua Igreja, na prática, aceitaria as consequências destes princípios de Paulo depois da sociedade, como foi o caso da escravidão e agora, da igualdade de homens e mulheres.

                   Em segundo lugar, Paulo respeita as culturas onde os cristãos estão inseridos. A cultura da época paulina é patriarcal. O marido/pai tinha todo o poder dentro da família, pois “as relações familiares eram de dominação pelo chefe da casa e de subordinação por parte da esposa, dos filhos e escravos e isso constituía a célula básica da construção do Estado, uma estrutura que se refletia nas classes e no status social” (MATOS, 2004, p. 79). Quando fala em I Coríntios 14 e em I Timóteo 2, acerca das reuniões da igreja, qual não seria a vergonha, dentro de uma sociedade deste tipo, que as mulheres não trariam para a igreja e seus maridos se começassem a exercer autoridade sobre os homens e tomassem a liderança em todas as reuniões. A igreja seria imediatamente mal vista por toda a sociedade e isto poderia implicar em perseguição contra ela por parte da sociedade e do Estado. O princípio que Paulo tem em mente é o não impedimento, por conta de desrespeitos à cultura local, da salvação de todos conforme I Coríntios 10.32-33:

Não vos torneis causa de tropeço nem a judeus, nem a gregos, nem a igreja de Deus; assim como também eu em tudo procuro agradar a todos, não buscando o meu próprio proveito, mas o de muitos, para que sejam salvos.


Não tornar causa de tropeço significa não afrontar os costumes que a sociedade da época pratica. Como o costume da submissão da mulher era generalizado em todo o Império Romano, essa era uma regra que deveria ser seguida. Por esta razão, Paulo não permitia que a mulher ensinasse na igreja ou exercesse domínio sobre os homens e dizia que ficassem caladas na igreja. Por esta razão também, ele diz que os bispos devem ser maridos de uma só mulher e “que governe bem a sua própria casa, tendo seus filhos em sujeição, com todo o respeito” (I Timóteo 3.2,4). Na compreensão paulina, a Igreja ainda está nesta velha era, e participa da situação humana decorrente da queda.

                   No entanto, todas as vezes em que Paulo subordina a mulher ao homem por questão cultural, ele compensa ensinando os princípios da nova era em Cristo. No texto de I Coríntios 11, acerca do véu das mulheres, ele insere os v. 11,12. Ele começa o v. 11 dizendo: “no Senhor”, a indicar que antes estava falando da questão cultural local, mas agora fala da nova era. Sua argumentação é que homens e mulheres não são independentes e ambos vêm de Deus. Em I Coríntios 14.34,35, as mulheres devem ficar caladas na igreja não podendo ensinar, mas podem profetizar e orar (11.5; 14.29-31). Em I Timóteo 2.9-15, onde a mulher não pode ensinar e nem exercer autoridade sobre homem, ele insere o v. 15 que diz respeito à “salvação” da mulher, ou seja, acerca da nova era em Cristo e que a faz ser protagonista no Reino de Deus. Até mesmo no texto acerca da família (Efésios 5.22-33), onde Paulo advoga claramente a liderança masculina, há compensações às mulheres. Se elas devem submissão aos maridos (v. 22), eles devem amá-las como Cristo amou a Igreja, ou seja, a ponto de se auto sacrificar em favor dela. Os maridos devem ter  igual cuidado por elas como a seus próprios corpos (v. 28,29) por qual motivo? “Porque somos membros do seu corpo” (v. 30). Paulo apresenta estas compensações em relação à mulher e diz que a relação marido/mulher deve ser diferente daquele que é o costume usual praticado pela sua sociedade simplesmente porque fazemos parte do Corpo de Cristo, a Igreja. É no âmbito da nova era do Senhor que os comportamentos culturais vão sendo mudados.

                   Outra observação é que Paulo, sempre que não houvesse “pedra de tropeço”, procurava, na prática da vida, igualar homens e mulheres. Em Romanos 16, quando saúda muitos irmãos que estão em Roma, ele fala de várias mulheres que trabalharam tanto quanto os homens no Reino de Deus e algumas em posição de liderança. Temos Febe (v. 1,2) que é diaconisa (grego: diáconos) e patrona, líder (grego: prostatis, v. 2):

Febe é também a única em Romanos 16 a quem a palavra prostatis é empregada. Prostatis é a forma feminina de um substantivo que significa “líder, pessoa que preside, que fica à frente, patrono”. Este substantivo provém da raiz verbal proistemi, que significa “governar e cuidar” como vemos em quatro passagens (I Timóteo 3.4,5,12; 5.17) (MICKELSEN, 1996, p. 231-232).


Encontramos o casal Priscila e Áquila (v. 3) que ele qualifica de “meus cooperadores” (interessante é o fato de Paulo citar a mulher antes do marido, incomum para a época). Maria (v. 6) “muito trabalhou por vós”. No v. 12: “saudai a Trifena e a Trifosa, que trabalham no Senhor. Saudai a amada Pérside, que muito trabalhou no Senhor”. No v. 7, ele diz: “saudai a Andrônico e a Júnias, meus parentes e meus companheiros de prisão, os quais são bem conceituados entre os apóstolos, e que estavam em Cristo antes de mim”. Andrônico e Júnias são chamados de “apóstolos”. Há uma grande discussão se “Júnia” é um nome feminino ou masculino (ver para nome feminino: MICKELSEN, 1996, p. 232-233; SILVA, 2013, p. 139; autores que manifestam incerteza: BRUCE, 1979, p. 219; LOPES, 2015, p. 4). Segundo Silva, “vale ressaltar que 9 mulheres são mencionadas ao lado de 17 homens na lista de saudação de Romanos 16.1-16 proporção numérica admirável para o contexto das relações patriarcais” (2013, p. 139). Richardson (apud MICKELSEN, 1996, p. 233) afirma: “o que esta relação demonstra é que num simples ambiente (Rm 16), numa lista coerente de saudações, as mulheres recebem mais honrarias do que os homens, a despeito do número destes ser superior e a elas se atribuem papéis mais influentes!”. Em Filipenses 4.2,3, Paulo cita Evódia e Síntique e diz que “trabalharam comigo no evangelho”. Em I Timóteo 3.8-13 ao falar acerca dos diáconos, Paulo diz no v. 11: “da mesma sorte as mulheres sejam sérias, não maldizentes, temperantes e fiéis em tudo”. As mulheres eram diaconisas na Igreja Primitiva, posição de destaque e liderança, mesmo num mundo patriarcal.



3.3 A POSSIBILIDADE PAULINA DO MINISTÉRIO PASTORAL FEMININO



                   Quando se trata especificamente da mulher assumir o pastoreio de uma igreja nos tempos atuais, a que conclusões chegamos dos escritos de Paulo? Será possível retirar princípios que, aplicados ao tempo e à cultura atual, permitam o exercício do ministério pastoral feminino? Teólogos divergem acerca desta possibilidade no ensino de Paulo.

                   Lopes, comentando os textos de Coríntios e Timóteo, manifesta-se contrário, argumentando que:

O princípio por detrás desta ordem (mulheres usarem o véu), conforme vimos acima, é o de apresentarem no culto em plena submissão à liderança masculina cristã. O uso do véu é a forma contextualizada pelo qual esse princípio se expressava. Hoje em dia, nas culturas ocidentais, o uso do véu não é uma expressão apropriada deste princípio. O princípio permanente que está subjacente em 1 Coríntios 11.2-16, 14.34-35 e 1 Tm 2.11,12 é o de que se mantenham as distinções e os papéis intrínsecos ao homem e à mulher na igreja e na família. Assim, a mulher não deve inverter os papéis, e ocupar posição de autoridade sobre os homens, quer seja para governá-los ou para ensiná-los. (2015, p. 20-21) (grifos do autor).


Grudem também se manifesta contrário a essa possibilidade:

essas (ensino e exercício de autoridade) eram as funções dos presbíteros da igreja e especialmente dos que conhecemos como pastor na igreja atual. São especificamente estas funções singulares de um presbítero que Paulo proíbe que as mulheres exerçam na igreja (1999, p. 787).

Foh também se posiciona contrariamente: “com respeito aos cargos da igreja, as mulheres não podem ser presbíteras (nem pastoras-mestras, nem evangelistas, nem ministras, como às vezes são designadas), porque esses cargos envolvem o ensino e o governo” (1996, p. 122).

                   Por outro lado, Mickelsen mostra-se favorável, pois:

Homens e mulheres cristãos não devem enredar-se e prender-se sob um jugo escravizador. Homens e mulheres devem pregar. Mulheres e homens devem fazer discípulos. Devem ministrar com os dons do Espírito. Cristo libertou homens e mulheres para que sirvam, amem, fortaleçam e apoiem as pessoas e delas cuidem. [...] O ensino de Gênesis, a vida e os ensinos de Jesus, o escopo e dos escritos e da prática de Paulo – tudo isso aponta para a completa dignidade das mulheres que têm sido chamadas e dotadas de talentos pelo próprio Deus, a fim de que sirvam à igreja e ao mundo (1996, p. 250) (grifo do autor).


Liefeld aponta para princípios, extraídos dos textos de Paulo, que permitem, hoje em dia, aceitar a liderança da mulher na igreja:

Paulo tinha um princípio básico que requeria a subordinação temporária dos demais princípios. Em Gálatas, Paulo estabeleceu o princípio de que o crente está “morto” para a lei. A salvação não é obtida mediante fazer-se as obras da lei do Antigo Testamento. Paulo insiste em sua autoridade de apóstolo. Como vimos, ele também estabeleceu um princípio concernente ao homem e à mulher em Cristo. Mas em I Coríntios, Paulo diz que ele, o apóstolo da liberdade da lei, está disposto a tornar-se “como sob a lei” a fim de ganhar os que estão sob a lei. O fato de assumir esta notável posição como que para remover as barreiras do evangelho, sem mudar sua posição sobre a salvação, à parte das obras da lei, deveria alertar-nos para a realidade de que ele também pode acomodar as normas sociais dos judeus e outras, concernentes às atividades públicas das mulheres, sem mudar sua posição, que é a da igualdade entre homens e mulheres. Se algumas pessoas do tempo de Paulo consideravam vergonhoso que a mulher falasse em público, ou aparecesse em público sem um véu facial, ou usasse o cabelo solto caindo sobre os ombros, quais são as implicações do fato de que, em nossos dias, e em nossa sociedade, é vergonhoso restringir as mulheres, tirando-lhes a igualdade com os homens, e a total oportunidade de expressão?  (1996, p. 172-173).


Ladd, discutindo a aplicação da ética social de Paulo, conclui:

A situação cultural e a estrutura da Igreja são bem diferentes do cristianismo do primeiro século, e o crente moderno não pode aplicar os ensinamentos da Escritura num relacionamento de igual para igual, mas deve buscar a verdade básica que subjaz às formulações particulares em o Novo Testamento (1985, p. 489).

                  

                   Os tempos passaram-se e as culturas e sociedades se transformaram. O Ocidente sofreu modificações nestes 21 séculos que o separam do Novo Testamento. Nas três questões éticas discutidas, o Ocidente firmou a monogamia, aboliu a escravidão e deu plenos direitos às mulheres ao ponto de algumas delas tornarem-se chefes de Estado. Todos estes avanços sociais foram conquistados exatamente pela tradição cristã de suas sociedades. Estes avanços não ocorreram nos países de tradição muçulmana, hinduísta, budista e de outras religiões. Se alguns países destas tradições assumiram estes avanços foi por conta da influência do Ocidente. É neste novo contexto que deve-se entender os ensinamentos de Paulo e de toda a Bíblia acerca do ministério pastoral feminino.

Precisamos entender que nos dias de Paulo o fato de uma mulher falar em público e ensinar na igreja constituía um problema moral que trazia vergonha à igreja e ao Senhor, impedindo as pessoas de virem a Cristo. Mas isto não constitui um problema na maior parte das sociedades de hoje, pelo menos no mundo ocidental. Na verdade, a situação sofreu uma reversão: proibir uma mulher de ter a mesma dignidade e oportunidade na Igreja de que ela desfruta na sociedade constitui uma pedra de tropeço para muitas pessoas. Portanto, ao tentar honestamente fazer a mesma aplicação (o silêncio das mulheres) em vez de seguir o mesmo princípio (evitar a vergonha e a desonra sobre o marido), cometemos hoje o mesmo erro que Paulo procurou evitar, isto é, ofender as sensibilidades morais das pessoas e impedi-las de aceitar o Evangelho (LIEFELD, 1996, p. 170-171).


As restrições bíblicas que impediam a mulher de ser pastora no período do Novo Testamento acabaram-se com a mudança das culturas das sociedades. As restrições paulinas estavam ligadas exatamente à cultura das sociedades onde ele vivia. Paulo, embora obediente aos costumes culturais de sua época para não “por tropeço” à evangelização ou à pregação do evangelho, sabia que, em Cristo, a nova era de Deus havia se iniciado e invadira a velha era de Adão. Em seus ensinos e na sua prática de vida, igualou homens e mulheres no Reino de Deus. Hoje, quando as práticas culturais foram mudadas e as mulheres assumiram seus direitos de igualdade com os homens, caíram por terra as restrições paulinas para o ministério pastoral feminino, mas permanecerão, para sempre, os princípios do Reino de Deus, a nova era de Cristo, pelo qual ele sempre lutou: “não há judeu nem grego; não há escravo nem livre; não há homem nem mulher; porque todos vós sois um em Cristo Jesus”. Esta nova era de Cristo, embora aqui e agora tenha invadido a presente era má, não chegou à sua consumação. Perto de sua morte, ao escrever sua segunda carta ao pastor Timóteo, ele assim se expressa sobre esta consumação e sobre a existência aqui e agora: “e o Senhor me livrará de toda má obra, e me levará salvo para o seu reino celestial; a quem seja glória para todo o sempre. Amém. Saúda a Priscila e a Áquila e à casa de Onesíforo” (II Timóteo 4.18,19).





4   CONSIDERAÇÕES FINAIS



A investigação nos escritos e teologia do apóstolo Paulo acerca da possibilidade do ministério pastoral feminino apontou caminhos para desvendar seu pensamento.

Há três textos relevantes nos escritos paulinos: Gálatas 3.26-29, I Coríntios 11-14 e I Timóteo 2.8-15. No primeiro texto (Gl. 3.26-29), Paulo expressa um princípio bíblico extremamente importante que ultrapassa a área da soteriologia: “em Cristo Jesus, não há homem nem mulher”. Este é um princípio que, pelo seu valor, regerá as demais orientações. Nos outros textos (I Co 11-14 e I Tm 2.8-15), ele restringe a atuação das mulheres na igreja, em especial na área da liderança pastoral. Ele assim o faz com base no respeito à cultura da época que era fortemente patriarcal. Mas, mesmo nestes textos, ele compensa a situação subordinada da mulher, lembrando acerca dos princípios e posição dos que estão “em Cristo”.

A teologia paulina fala de duas eras: a atual que procede da queda de Adão e onde todos estão e a nova era que foi inaugurada por Cristo com sua morte e ressurreição. Esta nova era, também chamada Reino de Deus, escatologicamente invadiu a história e formou um povo: a Igreja, comunidade dos que creem em Jesus Cristo. Ocorre que a Igreja vive em duas eras ao mesmo tempo e deve conciliar estas vivências. Viver na nova era de Cristo significa alcançar os princípios desta nova vida, que é a de Deus. Viver na era antiga significa discernir, dentro de cada sociedade e cultura, o que é bom e o que é mal. Este discernimento leva a Igreja a conformar-se com os costumes locais e temporais, mas com o firme propósito de modificá-los sempre de acordo com os princípios superiores da nova era em Cristo. Três costumes da época de Paulo são apresentados: a poligamia, a escravidão e a subordinação da mulher na sociedade e na Igreja. Para cada um desses problemas, Paulo pode conviver, pois são costumes sociais da presente era. Ele faz isto com o firme propósito de não colocar “pedras de tropeço” na Igreja a fim de que o evangelho possa ser pregado sem restrição e mais pessoas sejam salvas. Mas, ao mesmo tempo, sua orientação provocará uma erosão das bases filosóficas e ideológicas que sustentam estes costumes.

Por fim, os princípios superiores da teologia paulina levam ao entendimento de que a mudança da cultura da sociedade leva a uma nova postura da Igreja. Se, no primeiro século, era vergonhoso para a mulher falar em público e liderar homens, tal vergonha não existe mais. Pelo contrário, hoje é vergonhoso proibir a mulher de fazer tais coisas. Continuam de pé os princípios paulinos de que não devemos colocar “pedras de tropeço culturais” para que as pessoas venham a Cristo e que nele “não há homem, nem mulher”.

   

  


Mais uma objeção frequente a esta interpretação sobre mulheres no ministério é em relação as mulheres que ocupavam posições de liderança na Bíblia, principalmente Miriã, Débora e Hulda no Antigo Testamento. Esta objeção falha em perceber alguns fatores relevantes. Primeiro Débora era a única juíza entre 13 juízes homens. Hulda era a única profetisa mulher entre dúzias de profetas homens mencionadas na Bíblia. Miriã era irmã do profeta de Deus, com a liderança e era por ser irmã de Moisés e Arão. As duas mulheres mais importantes do tempo dos reis foram Atalia e Jezabel – péssimos exemplos de boa liderança feminina.


 Seria com base nesta personalidade que vieram a introduzir no Novo Testamento? Mais ainda, porém, a autoridade das mulheres no Antigo Testamento não é relevante para a questão, nenhuma mulher foi sacerdotisa em Israel, ainda que as filhas de Jetro e Débora e outras eram pastoras de ovelhas isso não significa que ovelha fosse o povo de Deus, então o sacerdote era o cuidador do povo de Deus e não de animais que não tinham almas nem espirito. O livro de 1 Timóteo e as Epístolas Pastorais apresentam um novo paradigma para a igreja  o corpo de Cristo e esse paradigma envolve a forma relevante de autoridade para a igreja, não para a nação de Israel ou de qualquer outra entidade do Antigo Testamento.


 


Este TCC trabalhou a visão paulina do assunto ministério pastoral feminino. A continuidade dos estudos deste assunto pode seguir dois caminhos: o primeiro é estudar como este assunto é tratado pelos outros escritores da Bíblia, olhando principalmente o pensamento e a ação de Jesus. Um segundo caminho é aprofundar a pesquisa para saber se, no pensamento paulino e bíblico, há diferença na subordinação da mulher ao marido na família e a subordinação feminina na Igreja e na sociedade. 


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SILVA, Roberta Alexandrina da. O problema do 1 Coríntios 11,1-6 e a questão de gênero na igreja de Corinto. Romanitas – Revista de Estudo Grecolatinos, Vitória/ES, n. 1, p. 13-22, 2013.


 





 Minha escrita


Este trabalho indaga os escritos e teologia do apóstolo Paulo para saber se na Bíblia ele deu abertura a Biblia para evangelização a um futuro ministério pastoral feminino. Avalia três textos acentuados para o assunto que são: Gálatas 3.26-29, I Coríntios 11-14 e I Timóteo 2.8-15. Explica a teologia paulina que fala de duas eras: a atual, que procede da queda de Adão e a nova era que foi estabelecida por Cristo com sua morte e ressurreição. O povo da nova era de Cristo é a Igreja, comunidade dos que creem nele. A Igreja vive em duas eras ao mesmo período e deve harmonizar estas vivências. Viver na nova era de Cristo constitui alcançar os princípios desta nova vida, que é a de Deus. Habituar-se na era remota significa enxergar, dentro de cada sociedade e cultura, o que é apropriadamente bom e o que é mal. Esta percepção leva a Igreja a concordar com os costumes locais e temporais, mas com a firme intenção de modificá-los, sempre de combinação com os princípios superiores da nova era em Cristo. Três costumes da época de Paulo são expostos: o matrimônio de um com muitos, a escravidão e a sujeição da mulher na sociedade e na Igreja. Para cada um desses enigmas, Paulo pode conviver, pois são tradições igualitárias da presente era. Ele faz isto com a firme intenção de não colocar “pedras de tropeço” na Igreja a fim de que a Bíblia e o evangelho possam ser pregados a todas as pessoas sem restrição e mais pessoas sejam salvas. Mas, ao mesmo período, sua orientação provocará uma erosão dos alicerces filosóficas e ideológicas que amparam estes atitudes. Por fim, os princípios elevados da teologia paulina induzem ao juízo de que a transformação da tradição da sociedade leva a uma nova maneira da Igreja na definição de vivenciar seus princípios elevados. Com a transformação cultural, abre-se a probabilidade da mulher ser ministra. Permanecem de pé as aberturas paulinas de que não devemos colocar “pedras de tropeço culturais” para que as pessoas cheguem a Cristo e que nele “não há homem, nem mulher”.


Palavras-chaves: Biblia e Evangelização. Mulher pastora. Pregadora feminina.  Pastora. Teologia paulina da mulher. Costumes e princípios paulinos sobre a mulher.


 

2 TEXTOS PAULINOS PROEMINENTES A RESPEITO DE A MULHER PASTORA FEMININA.....................................................................................5 2.1 GÁLATAS 3.26-29....................................................................................5 2.2 I CORÍNTIOS 11-14...................................................................................8 2.3 I TIMÓTEO 2.8-15....................................................................................15

3 UMA PROPOSTA TEOLÓGICA PAULINA PARA O MINISTÉRIO PASTORAL FEMININO.................................................................................20

 3.1 A TEOLOGIA PAULINA DAS DUAS ERAS...........................................20

 3.2 A VIVÊNCIA DA IGREJA NAS DUAS ERAS.........................................21

  3.3 A POSSIBILIDADE PAULINA DO MINISTÉRIO PASTORAL

 FEMININO.....................................................................................................30

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS........................................................................33

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..............................................................35






1    INTRODUÇÃO



                   O argumento “ministério pastoral feminino” é indefinidamente uma atitude critica no movimento evangélico brasileiro. Na Assembleia da Convenção Batista Brasileiro, por exemplo, existe uma intransigente discussão hoje sobre o assunto. Em 2012, em sua assembleia anual, a Ordem dos Pastores Batistas do Brasil deliberou que pastoras podiam filiar-se à Ordem, mas que, em cada Secção Estadual os pastores filiados deliberariam sobre o consentimento ou não de pastoras (CINTRA, 2015). A mesma contenda ocorre nas igrejas históricas, pentecostais e neopentecostais. A diferença entre tradicionais (os que não aceitam pastoras) e igualdades (os que aceitam) está muito exaltada, tanto no campo bíblico quanto no ético-social. Teólogos têm se despontado sobre o assunto e, como é de praxe, divididos (neste TCC, Culver, Foh, Lopes e Grudem são contrários; Liefeld e Mickelsen são favoráveis).

                   Para os que creem na criação divina e inerrância da Bíblia, a última palavra deve vir dela. O exame das Sagradas Escritura, nos textos acerca deste assunto, e a consequente teologia decorrida devem levar os cristãos a uma posição sobre a possibilidade ou não deste tipo de ministério pastoral. Este Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) parte da hipótese de que toda a Bíblia é inspiração de Deus, que as Escrituras devem explanar a Escritura, sempre com o uso da causa e que o apóstolo Paulo é o articulista das treze cartas que levam seu nome no Novo Testamento.

                   Na Sagrada Escritura, o apóstolo Paulo é o autor que mais se desponta sobre o assunto. Pelo alfarrábio de sua letra e pelo fundo teológico que confirmem de sua caneta, Paulo é o escritor sagrado mais citado, tanto ao benefício como contra o ministério feminino. Por este ensejo, este TCC apresenta como finalidade estudar o adágio paulino aproximar-se do assunto. Num primeiro momento, se cogitará as explanações e análises de extraordinários textos paulinos a propósito de o assunto e, num segundo momento, uma sugestão de teologia paulina abordagem da possibilidade do ministério pastoral feminino.





2    TEXTOS PAULINOS PROEMINENTES A RESPEITO DE A MULHER PASTORA FEMININO



                   O apóstolo Paulo é formulador teológico do Novo Testamento. Numa aparição tradicional, ele registrou treze cartas. Através destes escritos, é possível entender muito do pensamento cristão, pois encontramos neles o alicerce da fé. No entanto, Paulo não escreveu tratados de teologia. 

Ele simplesmente escreveu a igrejas e pessoas tão facilmente para orientar aproximar-se de problemas que eles estavam enfrentando. Ele levanta sua teologia a partir de dificuldades estágios e dá respostas a estes problemas em seu período e sua época, mas ainda ordena, além do ensinamento, princípios teológicos que ajudarão para todo momento e época.

                  Em afinidade ao assunto ministério pastoral feminino, o apóstolo Paulo formula entradas gerais e universais que aplanam homem e mulher na nova camada de salvação criada por Jesus e vivenciada na Igreja; nesta nova autorização, todos os dons são dados pelo Espírito Santo a todos os crentes, independente do gênero. Em originados assuntos, ele teve que afeiçoar-se estes princípios às classes culturais de sua época. Três destes assuntos são: a monogamia/poligamia, a escravidão e a liderança pastoral feminina na igreja. Neste sentido, Paulo tanto reafirmou a prática cultural de sua época quanto deu margem para uma transformação de postura em virtude de alteração de cultura, rumo aos princípios gerais e universais expostos em outros textos.

                   Existem três textos proeminentes sobre matéria que convém analisar: Gálatas 3.26-29, I Coríntios 11-14 e I Timóteo 2.8-15. Diferentes textos paulinos serão citados, porém estes três formam a base para uma definição chegar-se do assunto.



                  


2.2 I CORÍNTIOS 11-14

                  


                   Os capítulos 11-14 de I Coríntios abordam de questões referentes ao culto cristão. Visto que existiam problemas em relação a alguns aspectos, Paulo escreve no significado de orientar a igreja. Em 11.2-16, ele trata da questão do costume do véu por parte das mulheres no culto público. Em 11.17-34, da celebração da Ceia do Senhor. No capítulo 12, ele fala dos dons espirituais. I Coríntios 13 é o amplo capítulo sobre o amor. Em 14.1-25, ele debate acerca do dom de línguas e profecias no culto. E, finalmente, em 14.26-40 acerca da ordem e decência no culto cristão. Há dois textos que falam mais acerca da posição da mulher na igreja: 11.2-16 e 14.26-40.

                   O contexto cultural que admite entender este texto é o seguinte: as mulheres não participavam nos cultos das sinagogas, ao passo que elas tinham grande agilidade nos cultos pagãos, mas geralmente associadas a ritos de prostituição cultual. No culto cristão, a mulher fazia parte ativa, tanto quanto o homem e as congregações eram mistas. Em público, a mulher carecia usar um véu, em consideração a seu marido e à cultura da época. Existe um cuidado social de Paulo para com a figura da mulher, mas


o trecho relativo a 1 Cor 11,2-11 levanta algumas situações complexas concernentes à situação de Paulo envolvendo a disputa por autoridade. O velamento das mulheres, contudo, não foi somente uma questão de falta de decoro ou oriunda dos fatos de alguns membros da comunidade de Corinto se sentirem constrangida pela atuação das mulheres, mas o próprio ato de profetizar era visto como uma experiência direta com o divino, o que concedia autoridade a quem o fizesse (SILVA, 2013, p. 16).

                   O texto de 11.2-16, Paulo dar início dizendo que os louva porque eles mantêm as tradições conforme ele as deu. Convém advertir que, naquele momento, eles não apresentavam ainda o Novo Testamento, que estava em desenvolvimento. O ensino das tradições compreendia os costumes éticos e sociais incididas do próprio Evangelho. No v. 3, ele diz: “quero, porém, que saibais que Cristo é a cabeça de todo homem, o homem a cabeça da mulher e Deus a cabeça de Cristo”. A palavra “kephale,” cabeça é interpretada em dois sentidos: a de “autoridade, liderança” ou como “fonte”. Liefeld (1996, p. 161), aborda destes dois sentidos possíveis diz que


os tradicionalistas tendem a presumir que cabeça sempre quer dizer “governo” ou “autoridade”, e interpretam Efésios 5.22-23, a respeito de esposas e maridos e 1 Coríntios 11.2-16, a respeito da cobertura da cabeça. Outros eruditos têm demonstrado que cabeça é termo empregado para significar “fonte”. Embora os eruditos estejam tratando das mesmas evidências, a diferença na seleção e avaliação delas levam-nos a soluções fortemente conflitantes. Um estudo que selecionou certo número de usos da palavra “cabeça”, em sentido figurado, num total de 2.000 ocorrências, de início pareceu apoiar os significados de “governo” e “chefia”, mas a metodologia usada tem sido fortemente criticada. [...] No contexto mais amplo de Efésios kephalf significa tanto “governo” (1.22) como “fonte” (1.15-16).


Ainda que o significado de “cabeça” seja a de domínio deve-se notar que ela é funcional, pois Deus sendo o cabeça de Cristo não indica superioridade ontológica. Ainda sobre o significado do termo “cabeça”, Mickelsen (1996, p. 235) afirma que

o dicionário mais abrangente da língua grega daquele período de que dispomos hoje, em inglês, é o compilado por Liddell, Scott, Jones e McKenzie, cobre a língua grega clássica e o coiné (Koiné), de 1.000 a.C. até cerca de 600 d.C. – portanto, um período de quase mil e seiscentos anos, incluindo a Septuaginta (tradução grega do Antigo Testamento). O dicionário relaciona cerca de vinte e cinco possíveis significados figurados para kephale (“cabeça”) os quais eram usados na literatura grega antiga. Entre estes significados estão: “topo”, “beirada”, “ápice”, “origem”, “fonte”, “boca”, “ponto inicial”, “coroa”, “término”, “consumação”, “soma” e “total”. Essa lista não inclui nosso emprego comum em inglês com o sentido de “que tem autoridade sobre”, “líder”, “diretor”, “graduação superior” e outros sentidos semelhantes. (grifo do autor).


                   Nos v. 4-6, Paulo aconselha que todo homem que orar ou profetizar, que o faça com a cabeça descoberta, caso contrário envergonharia a si próprio. Este é um costume cultural da época. Acerca das mulheres, Paulo diz que toda mulher que ora ou profetiza com a cabeça descoberta desonra a si própria, pois

 oos dias de Paulo, mulher sem véu, com cabelos soltos ou curtos, era considerada infame. O uso do véu perpassava várias culturas, entre elas a judaica e a greco-romana, que dominavam o ambiente à época. Por isto, as honradas deviam ter o cabelo longo, preso e bem penteado. O cabelo solto era visto como um estímulo erótico, por isso, usá-lo solto em público era um ultraje ao pudor, pois era considerada uma parte privada do corpo, que só o esposo podia olhar [...] é provável que as mulheres-profetas achassem que podiam desempenhar seu papel na liturgia com a cabeça descoberta, pois a casa, lugar onde também se celebrava o culto cristão, não era um lugar público (FOULKES apud MATOS, 2004, p. 91-92).



Observe-se que as mulheres tinham o livre-arbítrio de orar e profetizar no culto cristão (v. 5), mas que deveriam fazê-los segundo os costumes sociais de sua época. No v. 7, Paulo diz: “pois o homem, na verdade, não deve cobrir a cabeça, pois é a imagem e glória de Deus, mas a mulher é a glória do homem”. É uma obrigação do ser humano não misturar os papéis culturais de homem/mulher. Não deve haver nem confusão nem mudança. Paulo enxerga nesta atitude da cultura de cobrir ou não a cabeça uma forma boa e verdadeira de expressar um fato bíblico da criação: Deus criou o homem e deste formou a mulher. É esta verdade que ele enfatiza-nos v. 8-10. Paulo considera apropriada a atitude cultural na qual a mulher comprova “submissão” tanto a seu marido como aos homens em geral ao adotar o sistema de divisão masculino/feminino dentro da sociedade patriarcal na qual viviam. No entanto, esta “submissão” não impede que a mulher ore e profetize no culto público, que são sinais de autoridade.

                   Nos v. 2-10, Paulo está discorrendo da necessidade de se seguir os tradições culturais para que não haja vergonha no culto cristão. Entretanto, nos v. 11 e 12, ele dá uma guinada no texto: “todavia, no Senhor, nem a mulher é livre do homem, nem o homem livre da mulher, pois assim como a mulher veio do homem, assim também o homem nasce da mulher, mas tudo vem de Deus”. Paulo estava dizendo da cultura, mas agora ele começa proferindo: “todavia, no Senhor”, o que indica que ele fala da nova ordem criada em Cristo liberta das amarras culturais de cada povo. Nesta nova ordem, homens e mulheres são iguais: um não vive sem o outro; homem e mulher se concluem e por isso devem viver juntos em unidade. Na criação, a mulher é tirada para fora do homem, mas no nascimento, o homem é tirado para fora da mulher. Isto devolve o equilíbrio e a unidade. Então ele diz: “mas tudo vem de Deus”. Tanto o homem como a mulher foram criados com sexualidades diferentes por  Deus e este convívio de interdependência e igualdade é o desejo e a proposta dele para a Igreja.

                   Nos v. 13-16, Paulo torna ao dia-a-dia e diz que há costumes na sociedade dos coríntios acerca do que é decoroso e honrado na relação homem/mulher e que a igreja cristã deve se submeter a fim de não molestar a sua boa presença na comunidade. O princípio que Paulo segue está bem especificado em I Coríntios 10.32-33: “não vos torneis causa de tropeço nem a judeus, nem a gregos, nem a igreja de Deus; assim como também eu em tudo procuro agradar a todos, não buscando o meu próprio proveito, mas o de muitos, para que sejam salvos”.

                   Possui algumas conclusões acerca do texto do “véu das mulheres” (I Coríntios 11.2-16). A primeira é que há uma forma de envolvimento homem/mulher ditada pela sociedade em que toda igreja cristã se encontra. Esta forma de envolvimento define os papéis culturais de masculino e feminino dentro da sociedade. O objetivo da sociedade e, convergentemente, de Paulo, é que estes papéis não se misturem, mas continuem distintos. Onde estes papéis são deliberadamente acareados não pode ter oração, profecia ou mesmo culto público que comunique a mensagem do evangelho para a sociedade. Daí a ordem paulina de cobertura para a mulher no culto e da não cobertura para o homem. A segunda conclusão é que, paradoxalmente, no Senhor, sem os costumes específicos das sociedades, o relacionamento homem/mulher é de igualdade e complementariedade. As mulheres podem orar e profetizar do mesmo feitio que os homens e têm parte ativa nos cultos tanto quanto os homens. Eles são iguais na criação e na redenção. Esta é a nova sociedade que Deus está formando.

                   No capítulo 12, Paulo fala a respeito dos dons espirituais. Dentre os vários exemplos que o apóstolo dá, destaca-se o v. 11: “mas um só e o mesmo Espírito opera todas estas coisas distribuindo particularmente a cada um como quer”. Ou seja, na distribuição dos dons, o Espírito é quem decide que dom dará a cada um. A determinação é dele e não humana. Não tem, no texto, nenhuma menção de que ele restrinja dons devido ao sexo da pessoa. Apóstolo Paulo refere o dom de profecia (v. 10) e já tinha dito que mulheres profetizavam (11.5). No v. 25, ele diz que a separação dos dons é “para que não tenha separação no corpo, mas que os membros tenham igual cuidado uns dos outros”. A igreja era composta de homens e mulheres. O que ele quer contar com “igual cuidado uns dos outros”? Não pensava ele numa igreja de iguais ao invés de uma igreja hierarquizada aonde a mulher viesse sempre ocupa um lugar subalterno? O v. 27 diz: “ora, vós sois o corpo de Cristo, e individualmente seus membros”. Na Bíblia o Evangelho e a visão paulina, a igualdade entre homens e mulheres na igreja é superior a qualquer hierarquização apresentada pelos costumes sociais.

                   No capítulo 13, Paulo acende o amor como a atitude principal que deve distinguir a igreja e o indivíduo cristão. Falando acerca da relação entre os dons e o amor, ele diz: “e ainda que eu tivesse o dom de profecia, e conhecesse todos os mistérios e toda a ciência, e ainda que tivesse toda a fé, de maneira tal que transportasse os montes, e não tivesse amor, nada seria” (13.2). Pode-se conter qualquer dom, inclusive o pastoral, mas sem amor, ele nada vale. Discorrendo acerca das qualidades do amor, Paulo diz no v. 5: “não se porta inconvenientemente, não busca os seus próprios interesses”. A ideia é que a pessoa que ama não envergonha os outros. Era uma ação de amor que as mulheres de Corinto não envergonhassem socialmente os homens, cultuando com a cabeça descoberta. Mas, era igualmente importante, que os homens amassem as mulheres de sua comunidade, não buscando apenas os interesses masculinos, mas também os delas.

                   No capítulo 14.1-25, Paulo confirma que o dom de profetizar (trazer uma mensagem de Deus compreensível e racional) é superior ao dom de línguas (trazer uma mensagem de Deus de forma incompreensível). Quando fala da profecia, ele diz: “mas o que profetiza fala aos homens para edificação, exortação e consolação” (v.3). Profetizar, entre outras coisas, era uma forma de ensino. Nos v. 23,24, ele diz: “se, pois, toda a igreja se reunir num mesmo lugar, e todos falarem em línguas, e entrarem indoutos e incrédulos, não dirão porventura que estais loucos? Mas se todos profetizarem, e algum incrédulo ou indouto entrar, por todos é convencido e por todos é julgado” (essa e minha interpretação) . Observa-se que toda a igreja pode profetizar, o que inclui homens e mulheres.

                   No texto de 14.2-40, Paulo orienta como deve ser um culto público. Há vários princípios descritos: o culto deve ser modificado e com a participação de todos; tudo deve ser feito para edificação; deve ser dinâmico e com ordem e decência. Os v. 33b a 35 parecem restringir às mulheres o direito de falar e ensinar na igreja

como em todas as igrejas dos santos, as mulheres estejam caladas nas igrejas; porque não lhes é permitido falar; mas estejam submissas como também ordena a lei. E, se querem aprender alguma coisa, perguntem em casa a seus próprios maridos; porque é indecoroso para a mulher o falar na igreja.


Existem três ordens nestes versículos, todas apontadas às mulheres: “silenciai”, “subordinem-se” (voz reflexiva) e “perguntai”. Numa primeira leitura, Paulo ordena que, nos cultos públicos, a mulher permaneça em silêncio e não fale nada. O aprendizado delas, quando houvesse dúvidas, seria feita em casa perguntando a seus maridos. Como interpretar este texto, se nos textos anteriores de I Coríntios 11-14, ele deu liberdade às mulheres de orar e profetizar em público e de participar ativamente no culto? Segundo Mickelsen (1996; 242-243).


há pelo menos duas possibilidades. É possível que Paulo esteja dizendo às esposas que parem de interromper o culto ao fazer perguntas a seus maridos, querendo saber o significado de tudo. Antes, deveriam perguntar-lhes em casa. Talvez Paulo estivesse fazendo menção a ensinos falsos dos judaizantes, que desejavam que as mulheres ficassem em silêncio na igreja, como tinham de ficar na sinagoga. [...] Usualmente, quando Paulo fala “da lei”, refere-se ao Antigo Testamento. Todavia, não existe uma passagem no Antigo Testamento que digam que as mulheres devem estar subordinadas ou que não podem falar em público. Então a que lei se refere esta passagem? Pode se referir a uma das numerosas leis locais, que proibia às mulheres falar em reuniões públicas. Ou pode referir-se à interpretação rabínica do Antigo Testamento. Se esta passagem for uma citação dos judaizantes, é provável que se refira a uma interpretação rabínica. Há outras possibilidades, ainda, mas ninguém pode dogmatizar com autoridade, sobre o sentido exato desses versículos, porque não conhecemos a situação sociocultural exata. Paulo o sabia, os coríntios o sabiam. Nós não o sabemos. [...] Visto que esses dois versículos parecem contradizer o que Paulo dissera anteriormente nesta carta, bem como o próprio costume de Paulo, concernente a Priscila e suas outras “colaboradoras” (“meus cooperadores em Cristo Jesus”), não ousamos usá-los com o objetivo de anular tudo o mais que Paulo escreveu e praticou.


Outra estudiosa, Foh (1996, p. 101-102) assim se exprime sobre este texto

o verbo usado junto com “silêncio” nesta passagem tem a conotação de ausência de fala. Então seria absoluto o silencio exigido das mulheres? Se isso for verdade, as mulheres não poderiam cantar, participar de jograis, de leituras responsivas, orar em voz alta, nem mesmo pronunciar a oração dominical. Se assim for, tudo quanto foi dito antes, que envolve falar em línguas, profetizar e compartilhar verbalmente na igreja, não diz respeito à mulher e deveria ter um carimbo: “só para homens”. A expressão “vós todos” de 14.5 deveria excluir as mulheres. [...] Além disso, Paulo emprega o termo “conservem-se as mulheres caladas” em 1 Coríntios 14, mas não sugere um silêncio absoluto, pois o contexto define que tipo de silêncio o apóstolo tem em vista. “Mas, não havendo intérprete, fique calado na igreja, falando consigo mesmo e com Deus” (1 Co 14.28), e, “se, porém, vier revelação a outrem que esteja assentado, cale-se o primeiro” (1 Co 14:30). Em nenhum dos casos, presume-se que o silêncio deva ser absoluto; a pessoa que tiver o dom de falar em línguas pode certamente participar de cânticos, de orações e assim por diante, ainda que esse crente não possa falar em línguas sem que haja intérprete. [...] O apelo de Paulo à lei em geral é sentido como um golpe tremendo para manter as mulheres sob controle. Mas há outra maneira de ver a questão. A lei pode ser vista como um limite. A mulher não precisa submeter-se naquilo que a lei não exige; a mulher só deve submeter-se segundo as exigências da lei. O Antigo Testamento permitia que a mulher profetizasse; portanto, 1 Co 14.34 não proíbe às mulheres o dom de profetizar. O que a lei exige é a submissão, e não o silêncio. O mandamento no v. 34 pode ser traduzido assim: “mas devem submeter-se”. “Esteja subordinada” ou “fique sujeita” são formas passivas que ressoam uma nota de servilismo. Mas o verbo grego é reflexivo. Trata-se de um ato que a própria pessoa executa por si mesma, ou de si mesma. A mulher, sendo ontologicamente igual ao homem, de vontade própria submete-se em reconhecimento de sua posição de mulher. O v. 35 também define o sentido de silêncio, ou de deixar de falar, que Paulo tem em mente. Falar seria entendido então como fazer perguntas. O diálogo, com perguntas e respostas, era a forma comum de estudo acadêmico do primeiro século. Não se permitia à mulher que levantasse perguntas em diálogo, porque esta era uma forma de ensino.

                  

  Visto acima, estudiosos discordam sobre a interpretação do texto, mas não afirmam que o silêncio da mulher é absoluto, como parece ser a orientação do texto à primeira vista. Culver, que advoga a ideia conservadora de que a mulher deve permanecer em silêncio na igreja, interpreta este texto assim: “parece que a ideia é no que concerne ao ato de ensino públicona igreja, as mulheres deveriam estar em silêncio” (1996, p. 38)  (grifo do autor). Outra observação é que o “silêncio” da mulher sempre é acompanhado de explicações possíveis sobre o que acontecia na época em que o texto foi escrito, quer seja intérprete conservador, quer seja igualitário.

                   Outro problema na interpretação destes textos é se o culto e sua liturgia no primeiro século eram exatamente iguais aos cultos atuais com uma liderança e liturgias formais. Ridderbos (2014, p. 534), um teólogo perito em Paulo, afirma acerca dos cultos públicos

agora, no que ser refere a estas reuniões da Igreja, de forma alguma é o caso que em Paulo tenhamos recebido informações detalhadas ou prescrições. Nas epístolas que foram preservadas e chegaram até nós, ele fala dessas reuniões incidentalmente, na maioria das vezes, com relação a certos abusos e pressupondo muitas coisas que, com frequência, não ficam claras para nós e sobre as quais gostaríamos de saber mais. Assim, desde o início, é difícil, tomando por base as epístolas paulinas, determinar se e até que ponto estas reuniões estavam sob a orientação específica de pessoas designadas para este propósito. Esta questão está, obviamente, ligada de maneira muito próxima àquela da presença de pessoas com cargos na Igreja de um modo geral. Tomando-se como ponto de partida uma passagem como 1 Coríntios 11.17ss, há muito pouco que deixe evidente uma ordem fixa; antes parece haver uma escassez de liderança. O mesmo aplica-se a 1 Coríntios 14, onde Paulo vê-se obrigado a colocar claramente para a Igreja que Deus não é, afinal de contas, Deus de confusão (v. 33). Por outro lado, tudo isso certamente não é prova de que nas reuniões da igreja não havia, geralmente, uma liderança [...] Com tudo isso, podemos considerar que muito mais coisas foram pressupostas do que aquilo que é expressado com todas as letras. No entanto, fica evidente pela maneira como, também a esse respeito, Paulo dirige-se continuamente à Igreja e não a uns poucos que ocupam posições de liderança ou cargos, o quanto os encontros da Igreja não são uma reunião hierárquicos, ou oferecidos por umas poucas pessoas “santas”, mas têm um caráter plenamente congregacional.


Nas contendas atuais sobre os textos paulinos, há uma tendência de conduzir a hierarquia e liturgia dos cultos atuais para interpretar os cultos do I século. Aqueles eram cultos bastante informais, realizados nas casas de pessoas da comunidade, e contando com a participação de muitos como se infere de I Coríntios 14.26. Os cultos tinham a participação ativa de mulheres (I Co 11.5).



2.3 I TIMÓTEO 2.8-15

                  


                   Um texto bastante discutível sobre o assunto é I Timóteo 2.8-15. A primeira carta de Paulo a Timóteo tem como objetivo orientar o jovem pastor na sua tarefa de aparelhar a igreja. Uma das razões de preocupação de Paulo era em afinidade aos falsos ensinos que ateavam em Éfeso nesta época: “como te roguei, quando partia para a Macedônia, que ficasse em Éfeso, para advertires a alguns que não ensinassem doutrina diversa” (1.3). Éfeso era uma cidade caracterizada pelo templo à deusa Diana (Ártemis) e onde Paulo passou por grande perigo de vida ao pregar o evangelho (Atos 19.23-41). A adoração desta deusa envolvia a prostituição cultual.

                   É neste envolvente de heresias e promiscuidade que temos de entender o texto de I Timóteo 2.8-15. No v. 8, Paulo demonstra seu desejo de que os homens em todo lugar ergam mãos santas, sem ira e nem contenda. O que distingue o homem cristão não é a dominação, mas a plena vivência de uma santidade prática que busca Deus e sua vontade e não contendas humanas impregnadas de ira. “A preocupação de Paulo para com homens e mulheres não se focaliza nos aspectos externos, mas na condição do coração que causa os sinais externos” (FOH, 1996, p. 96).

                   Dos versos 9-15, o apóstolo fala às mulheres. No v. 9, ele começa com a expressão “do mesmo modo”. Isto significa que o objetivo do ensino que foi dado ao homem, agora é dado à mulher: uma vida de santidade prática. Nos v. 9 e 10, ele faz um contraste entre a exterioridade e a interioridade da mulher

quero, do mesmo modo, que as mulheres se ataviem com traje decoroso, com modéstia e sobriedade, não com tranças ou com ouro, ou pérolas ou vestidos custosos, mas (como convém a mulheres que fazem profissão de servir a Deus) com boas obras.


Os cabelos trançados, ouro, pérolas e roupas caras faziam parte tanto das mulheres da alta sociedade como também das prostitutas, inclusive as cultuais. Mickelsen (1996, p. 246) fala deste contexto

a maior parte das mulheres gregas casadas usava uma catastola, um roupão que descia até os pés, preso por um cinto. Um traje muitomodesto. A respeito de quem Paulo  estava escrevendo? Aqui devemos levar em consideração o contexto histórico e cultural, bem como o contexto literário. Em Éfeso, com seu templo enorme erguido à deusa Artemis, havia centenas de sacerdotisas sagradas que provavelmente também serviam como prostitutas cultuais. Também havia centenas de hetaerae, mulheres gregas mais educadas, acompanhantes regulares e com frequência parceiras sexuais extramaritais de homens gregos das classes superiores. É possível que algumas dessas mulheres se tenham convertido e estivessem usando suas roupas caras, indecorosas na igreja. Visto que as hetaerae com frequência eram professoras respeitáveis de homens na Grécia (muitas delas são mencionadas na literatura grega), com toda probabilidade estavam tornando-se professoras depois de ingressar na igreja. Aparentemente, a falta de castidade e modéstia era um problema real entre algumas mulheres da igreja de Éfeso, pois Paulo menciona duas vezes nesta seção (I Tm 2.9,15) ser necessária a castidade (no grego, sophrosyne).


A solicitação de Paulo é as mulheres cristãs sejam distintas delas. Em primeiro lugar, não dando tanto importância ao que é externo embora declare que as suas roupas devem ser bem arrumadas e caracterizadas pelo decoro social e autocontrole. Este comportamento acerca do vestuário é conveniente para mulheres piedosas (tementes a Deus). Mas, acima de tudo, o que deve caracterizá-las socialmente é a prática de todo tipo de boas obras. A preocupação delas deve ser fazer o bem às pessoas.

                   No contexto, poderia incidir que as mulheres assumissem a comando e o ensino da igreja cristã. Preocupado com o preceito de sua época, que é patriarcal, Paulo continua sua orientação no v. 11: “a mulher aprenda em silêncio com toda a submissão”. Aqui há um aspecto positivo e um problema de tradução. O aspecto positivo é que a mulher cristã pode “aprender”. O que era negado em outras religiões da época, onde as mulheres eram usadas como objetos ou completamente desconhecidas, no cristianismo dar valor a mulher como pessoa que pode aprender e crescer intelectualmente. Aprender não é só para os homens, é para todos. O problema de tradução encontra-se na palavra explanada como “silêncio”. No texto grego, “esukia” pode denotar “silêncio”, mas o melhor sentido é “tranquilidade, calma”: “a palavra expressa a tranquilidade em geral” (RIENECKER; ROGERS, 1985, p. 460). A mulher deveria aprender, não em silêncio, mas com tranquilidade, ou seja, com toda a submissão. Não cabia a ela, pelo seu comportamento, usar a igreja para fazer a mudança de sua sociedade patriarcal. Até porque Paulo sabia que este comportamento traria enorme prejuízo para a igreja na sua tarefa de evangelizar o mundo de então.

                   Prosseguindo em sua orientação, Paulo vai fazer duas exceções às mulheres no v. 12: “pois não permito que a mulher ensine, nem tenha domínio sobre o homem, mas que esteja em silêncio”. A primeira exceção é que ele não permitia que a mulher ensinasse. A segunda exceção é que a mulher não poderia dominar homem. O verbo habitual da língua grega para exercer autoridade é “exousiazo”. Aqui Paulo não usa esta palavra, mas usa o verbo “authenteo”. Este verbo é usado somente aqui em todo o Novo Testamento. É traduzido como “exercer autoridade, dominar, ser um autocrata, ser dominador” (RIENECKER; ROGERS, 1985, p. 460). “Essencialmente, authenteinsignifica ‘atirar-se’ e em geral tem um sentido negativo [...] outro conceito primitivo  era ‘originar’ algo ou ‘ser responsável’ por alguma coisa” (MICKELSEN, 1996, P. 247). Por que Paulo usa uma palavra tão diferente ao invés de usar a palavra corriqueira para o exercício da autoridade? O restante da frase, ao invés de “mas que esteja em silêncio” poderia ser “mas ser (viver) em tranquilidade”, pois se trata da mesma palavra “esukia” do versículo anterior. As duas restrições: não ensinar e não comandar homens são típicas de sua sociedade.

                   Para dar alicerce escriturística para estas duas exceções impostas à mulher, o apóstolo cita o exemplo de Adão e Eva. Os v. 13-14 dizem assim: “porque primeiro foi formado Adão, depois Eva. E Adão não foi enganado, mas a mulher, sendo enganada, caiu em transgressão”. As razões para que a mulher não ensine e nem domine sobre homens vem de dois exemplos históricos: 1º) Adão foi formado primeiro e depois Eva, que veio dele; 2º) Adão não foi enganado, mas Eva foi e bem enganada, tornando-se transgressora das ordens de Deus. Estes exemplos bastam para justificar que, em sua cultura, a mulher submeta-se ao homem.

                   Paulo poderia ter terminado sua argumentação no v. 14 e seu objetivo teria sido atingido. No entanto, ele escreve o v. 15 com um sentido aparentemente enigmático: “salvar-se-á, todavia, dando à luz filhos, se permanecer com sobriedade na fé, no amor e na santificação”. Obviamente, esta salvação do v. 15 não é um ensino geral porque se assim fosse, mulheres que não gerassem filhos não poderiam ser salvas e, além disso, a salvação seria pelas obras. A salvação do v. 15 está descrita deste modo para se redarguir aos v. 13 e 14. Em I Coríntios 11.2-10, quando também falou da submissão social da mulher ao homem, Paulo “compensou” esta situação da mulher registrando os v. 11 e 12, onde narrava que “no Senhor, nem a mulher é independente do homem, nem o homem independente da mulher; pois assim como a mulher veio do homem, assim também o homem nasce da mulher, mas tudo vem de Deus”. Outro exemplo do apóstolo fazendo esta “compensação” encontra-se em I Coríntios 7.1-6, quando ele fala das relações sexuais no casamento. No v. 1, ele fala “bom seria que o homem não tocasse em mulher”, olhando do ponto de vista masculino. Quando se esperava que ele falasse da dominação masculina também nas relações sexuais, ele escreve o v. 4: “a mulher não tem autoridade sobre o seu próprio corpo, mas sim o marido; e também da mesma sorte, o marido não tem autoridade sobre o seu próprio corpo, mas sim a mulher”. Paulo faz o mesmo tipo de “compensação” aqui. O v. 15 é um contraponto aos v. 13-14. As razões de a mulher ser subordinada na sociedade e, consequentemente, na igreja, têm como primeiro argumento que Eva foi formada de Adão (v. 13). O contraponto é que a mulher gera filhos, dentre os quais homens. Eles vêm delas. O segundo argumento é que Eva foi enganada; a resposta no v. 15 é que o engano se desfaz quando a mulher, na salvação de Jesus Cristo, permanece na fé, no amor e na santificação (todas estas são qualidades necessárias na salvação) e tudo isto com sobriedade (grego: sofrosyne) que “significa basicamente o autodomínio nos anseios físicos é aquele autocontrole interior habitual, com seu domínio constante sobre todas as paixões e desejos” (RIENECKER; ROGERS, 1985, p. 460). Uma mulher que vive a salvação com fé, amor e santificação, controlando seus desejos e paixões é o exato contrário de uma Eva enganada. O ensino aqui é que a nova vida em Cristo, a salvação do v. 15, concede à mulher um lugar reabilitado que havia perdido na queda e pela qual sofre a consequência de subordinar-se na sociedade. A salvação de Jesus devolve-lhe a mesma igualdade com o homem e, neste âmbito (a Igreja), não existe mais a superioridade masculina e nem a subordinação da mulher, pois “em Cristo Jesus, não há homem nem mulher”.

                  




   3    UMA PROPOSTA TEOLÓGICA PAULINA PARA O MINISTÉRIO PASTORAL FEMININO



3.1 A TEOLOGIA PAULINA DAS DUAS ERAS



                   A teologia paulina vê o evento “Cristo”, principalmente sua morte e ressurreição, como o centro da atuação de Deus na história (I Coríntios 15.3,4; 2.2; Romanos 6.4-10; Gálatas 2.20; 4.4-6). Como rabino judeu, Paulo entendia que a período atual era controlada pelo mal, mas que viria uma época vindoura que daria início com o Dia do Senhor e na qual Deus instalaria o seu Reino em definitivo na Terra, vencendo todo o mal. “Saulo, o judeu, participava da esperança judia da vinda do Messias, de uma forma ou de outra, para aniquilar seus inimigos, redimir Israel e colocar o Reino de Deus” (LADD, 1985, p. 343). Quando Paulo converte-se a Jesus no caminho de Damasco (Atos 9.1-19) seu pensamento acerca das eras presente e vindoura muda, em especial, porque ele passa a crer em Jesus como o Messias. Logo, a era messiânica já havia iniciado. Segundo Ladd (1985, p. 343-352), para Paulo, a atual era/século (grego: aion) era assinalada pelo domínio do pecado e estava em rebelião contra Deus, sendo dominado pelo seu deus, Satanás (II Coríntios 4.4). Com a vinda de Jesus, o Messias, seu Reino já estava na Terra e foi trazido ao seu povo, mesmo que o mundo não o pudesse perceber (Colossenses 1.13). O reinado de Jesus não começaria na parousia (vinda) e se estenderia ao telos (fim), mas principiou na sua ressurreição e iria até o telos. Desta forma, a partir de Jesus Cristo, a era (aion) vindoura entrou na história humana. Apesar a era vindoura ainda permaneça por vir, sua força e suas bênçãos invadiram a presente era das trevas. Os que acreditam em Jesus passam a viver em duas eras simultaneamente. Precisam viver neste mundo, dentro de suas culturas com suas responsabilidades e, ao mesmo momento, são a comunidade do Senhor que goza da nova vida em Cristo: “pelo que, se alguém está em Cristo, nova criatura é; as coisas velhas já passaram; eis que tudo se fez novo” (II Coríntios 5.17). Uma nova vida está aberta aos homens: a existência “em Cristo”.

Ele agora sabia que Jesus é o Messias, o Filho de Deus, que inaugurou uma nova era, que requeria de Paulo uma nova atitude diante dos homens. Ele não os via mais como judeus e gregos, escravos e livres. Tais distinções, embora reais, não mais interessavam. Todos eles são homens amados por Deus, por quem Cristo morreu a quem ele tem que levar as boas novas da novidade da vida em Cristo (1985, p. 351).


Qual então é centro da teologia paulina?


A teologia de Paulo é a exposição dos novos fatos redentores; a característica comum, em todas as suas ideias teológicas é o seu relacionamento com o ato histórico de Deus da salvação em Cristo. O significado de Cristo é a inauguração de uma nova era de salvação. Na morte e ressurreição de Cristo, as promessas da salvação messiânica do Velho Testamento se cumpriram, mas dentro da era antiga. O novo veio dentro do alicerce do antigo; mas o novo também está destinado a transformar o antigo. Portanto, a mensagem de Paulo é tanto de uma escatologia realizada como futurística (1985, p. 352).

                  

                   A nova era, ou o Reino de Deus, que Jesus trouxe cria a Igreja como a comunidade do Reino. A Igreja está implantada nas comunidades da velha era e com elas terá de conviver. Mas a Igreja, em si, é uma comunidade totalmente desigual porque ela é escatológica. Ela pertence ao futuro; na verdade, é a comunidade dos remidos que habitarão o céu: “mas a nossa pátria está nos céus, donde também aguardamos um Salvador, o Senhor Jesus Cristo” (Filipenses 3.20). É nesta tensão que a Igreja vive: ela é a comunidade da nova era que Cristo iniciou, mas, ao mesmo tempo, ela tem que viver na velha era com seus costumes, tradições e comportamentos derivados tanto da imagem de Deus que ele colocou na humanidade (Atos 17.25-29) quanto da queda (Romanos 1.28-32).

                       Muita igreja e ministério ainda existem certo preconceito a respeito da teologia por parte de muita gente nas igrejas, especialmente entre o povo evangélico, de que "estudar demais torna as pessoas criticas ou céticas" existem muitos casos de colegas que abandonaram o estudo por não conseguirem aceitar as diferentes visões nas quais excluem as mulheres como pastoras somente ao homem este direito. Paulo ver o caminho para o pastorado não no singular, mas como plural, mas pode variar conforme a vertente de alguma igreja.


  3.2 A VIVÊNCIA DA IGREJA NAS DUAS ERAS



                   A Igreja, esta comunidade em confusa, terá duas empreitadas em sua peregrinação nesta terra. A primeira é viver as frestas da nova era que Cristo trouxe com as importâncias da ética do Reino de Deus. Um dos princípios é que o principal benefício da ética e existencial que Jesus ensinou e que Paulo salienta é o amor (I Coríntios 13; Romanos 12.9-10; 13.10; Gálatas 5.6; Efésios 5.2; Filipenses 2.2; Colossenses 3.14; I Tessalonicenses 3.12; I Timóteo 1.5; Tito 2.2; Filemom 5). O amor rege todas as demais virtudes, mas este amor é constantemente qualificado, como em I Coríntios 13.4-7. 

                  Diz Paulo em I Tessalonicenses 5.21-22: “mas ponde tudo à prova. Retende o que é bom; abstende-vos de toda espécie de mal” e em Filipenses 4.8: “quanto ao mais, irmãos, tudo o que é verdadeiro, tudo que é honesto, tudo que é justo, tudo que é puro, tudo que é amável, tudo que é de boa fama, se há alguma virtude, se há algum louvor, nisso pensai”. Estes dois textos, entre outros, servem para confirmar que Paulo entendia que há coisas boas e más nas culturas e incumbia aos cristãos usar as Escrituras e a razão para distinguir e, tanto aprovar como rejeitar, pois “não vos conformeis a este mundo, mas transformai-vos pela renovação da vossa mente” (Romanos 12.2).

                   Um problema difícil para a Igreja na execução destas duas tarefas é que o evangelho geralmente chega depois da cultura. As sociedades estão formadas com seus valores próprios, distantes de Deus e de sua vontade. O evangelho produz mudanças nos que creem (Efésios 2.11-13; Filipenses 1.5,6; I Tessalonicenses 1.5,6), mas em muitos aspectos, a noção de certo e errado, bem e mal, está atrelada àquilo que são os costumes de cada sociedade. Assuntos como alimentação, vestuário, formas de tratamento, diferenciação social, papéis do homem e da mulher, relacionamento familiar, entre outros, são parte da formação cultural de cada povo em cada época específica. O homem forma a cultura e é formado por ela. Assim, muito do que seja bem ou mal para um cristão permanecerá atrelado ao que a sua sociedade lhe ensinou. Em contato com os inícios da nova era em Cristo, tensões aparecerão e a Igreja precisa da orientação inspirada dos escritores da Bíblia. Nem sempre, em toda a cultura, a Igreja conseguirá viver de modo pleno os princípios básicos da fé, todavia terá de se adaptar-se até que a situação deixe vivê-los.

                   O problema em cumprir as duas tarefas da Igreja (viver os princípios bíblicos principais e separar, na cultura, o que é bem e mal) pode ser observado em três assuntos culturais sobre os quais Paulo fala: subordinação da mulher ao homem na igreja e na sociedade, a monogamia/poligamia e a escravidão. Todos estes assuntos faziam parte da vida das sociedades greco-romanas e judaicas da época do apóstolo Paulo.

                   Acerca da assunto da monogamia/poligamia, Rega (2009, p. 66-70) expõe o que ele chama de “situações críticas fronteiriças” (2009, p. 66). São situações cujo comportamento da sociedade destoa da ética do evangelho e, temporariamente, se aceita aquele procedimento, mas tomando ações que visem uma futura mudança. Ele cita como situações assim, da época de Paulo, a poligamia e a escravidão. Acerca da poligamia, Rega afirma que os princípios bíblicos ensinam as famílias a serem unidas pelo amor (Colossenses 3:12-14). A palavra de Deus também resguarda as famílias por ensinar outro principio orientador: que o casamento deve ser permanente (Gn 2:24). Por seguirmos os princípios bíblicos, podemos resguardar em sentido material e emocional. Por exemplo, os padrões normalmente preferem empregados que seguem os princípios bíblicos da honestidade e da diligencia (Provérbios 10:4, 26; Hebreus 13:18). Na Palavra de Deus, somos educados a ficar contentes quando as nossas necessidades básicas são satisfeitas, Paulo nunca quis esperar ser dependente dos outros, ele dava valor a amizade com Deus, das coisas materiais. 


Paulo, por exemplo, teve que lidar com situações complexas para a cultura da época. Ao tratar da questão do incesto (I Coríntios 5.1-5), sua resposta foi radical: expulsão do incestuoso da comunhão da igreja. Em outra ocasião, no entanto, Paulo teve de encontrar uma alternativa diferente. Foi o caso dos homens que, embora casados, tinham outra mulher. Essa situação era tolerável na cultura da época, mas esses homens estavam se convertendo e se integrando às igrejas. [...] No primeiro caso, Paulo procurou estabelecer uma liderança que servisse de modelo para as gerações futuras. A situação dos que se convertiam não podia ser imediata e radicalmente alterada – ainda que de natureza complexa à luz da compreensão matrimonial e familiar bíblica – sob pena de gerar sérias dificuldades à sobrevivência familiar. A abordagem de Paulo para esta situação está descrita nos critérios para a escolha dos presbíteros e diáconos da igreja. Paulo enfatiza que o líder deveria ser marido de uma só mulher (v. 1 Tm 3.2,12; Tt 1.6). [...] Por que Paulo teria mencionado este critério ao descrever o perfil para os líderes das igrejas? Será que a igreja abrigava entre os membros pessoas que praticavam a poligamia ou que viviam a forma disfarçada de concubinato? Embora não haja registros de situações como essas, D. A. Carson lembra que a poligamia era praticada especialmente pela aristocracia, e em algumas províncias. [...] Outra possibilidade dentro deste raciocínio é que a proposta de Paulo visava formar uma liderança que seguisse o padrão bíblico de vida, inclusive nas relações matrimoniais, ou seja, a liderança abandonaria práticas culturais que conflitassem com padrões bíblicos. Isso quer dizer que os convertidos em estado matrimonial aceito social e legalmente (poligamia ou concubinato, p. ex.) poderiam mantê-lo (1 Co 7.17-24), mas não lhes seria permitido ocupar função de liderança. Com isso podemos deduzir que Paulo possuía um ideal ético a ser perseguido: monogamia como padrão para o matrimônio. No entanto, havia uma situação real vivida (ou pelo menos hipotética): a poligamia (real ou disfarçada em concubinato), que se desejava eliminar, objetivando atingir, mais tarde, o ideal ético. Paulo levanta uma liderança modelo para ser seguida pelas gerações futuras. Ou seja, tolerou-se provisoriamente uma situação enquanto as bases para conquistar o ideal ético bíblico eram lançadas. (2009, p. 66-70) (grifos do autor).

                  

O texto de Rega confirma que Paulo foi capaz de tolerar a possibilidade da poligamia para os novos cristãos devido à cultura deles, trabalhando para que, no futuro, a monogamia fosse o ideal matrimonial de todos.

                   Diversos autores, quando falam da submissão da mulher ao homem, buscam nos textos da criação (Gênesis 1 e 2) a razão para que seja assim para sempre. Nestes mesmos textos, há a ordem de Deus para a monogamia (Gn 2.24). Este sempre foi o ideal de Deus para o matrimônio. Os homens construíram sociedades onde a poligamia imperava (basta ler o livro de Gênesis). No entanto, apesar de ter dado seu ideal no Éden, Deus tolerou este “desrespeito” ao seu padrão, respeitou as culturas e, ainda por cima, usou para sua revelação homens polígamos, como foi o caso de Abraão, Jacó, Davi e Salomão, entre outros. É de se destacar que o povo eleito de Israel foi formado de um homem chamado Jacó que tinha duas esposas e duas concubinas e, com elas, formou as 12 tribos da nação através da qual Deus se revelaria ao mundo (Gênesis 35.23-26). Na época de Paulo, havia a poligamia como algo natural em algumas sociedades. Paulo trabalhou para mudar esta situação em favor da monogamia (I Coríntios 7.2; Efésios 5.22,24; I Timóteo 3.2), mas sabia que estava “lançando as bases para conquistar o ideal ético bíblico para evangelização”.

                   Diferente ponto cultural que gerava conflito com o ensino da Bíblia e a evangelização era a escravidão. Ao passo que a poligamia era exceção no mundo greco-romano e judaico, a escravidão era endêmica, pois “a escravidão era universal e própria da textura da sociedade. Tem-se considerado que, no tempo de Paulo, existiam tantos escravos, quanto homens livres em Roma e a proporção de escravos para homens livres, na Itália, eram de três para um” (LADD, 1985, p. 490). Qual o princípio da Bíblia pressuposto nos textos da criação? A de que todo ser humano é livre porque cada um foi criado à imagem de Deus (Gênesis 1.27). Além disso, a ordem divina é que homem e mulher deveriam dominar a natureza e os demais seres: “enchei a terra e sujeitai-a; dominai sobre os peixes do mar, sobre as aves do céu e sobre todos os animais que se arrastam sobre a terra” (Gênesis 1.28). Em nenhum lugar é dito que eles deveriam dominar outros seres humanos. As sociedades formadas pelos homens produziram culturas favoráveis à escravidão. Assim, a escravidão tornou-se um costume cultural do mundo antigo e o era na época de Paulo.

(Pag 19) Em I Coríntios 7.21-24 Paulo assim se manifesta com respeito ao assunto.

Foste chamado sendo escravo? Não te dê cuidado; mas se ainda podes tornar-te livre, aproveita a oportunidade. Pois aquele que foi chamado no Senhor, mesmo sendo escravo, é um liberto do Senhor; e assim também o que foi chamado sendo livre escravo é de Cristo. Por preço fostes comprados; não vos façais escravos de homens. Irmãos, cada um fique diante de Deus no estado em que foi chamado.


O chamado ao qual ele se refere é a conversão a Jesus Cristo. O que a pessoa era na sociedade, devia continuar a ser. Apesar de saber que a liberdade é um valor superior provindo do próprio Deus, Paulo nunca falou contra a escravidão e nunca incitou os escravos cristãos a se rebelarem. Pelo contrário, quando o escravo fugitivo Onésimo se converteu através de sua pregação, Paulo o mandou de volta ao seu senhor (Filemom v. 12). A ordem é: se você se converteu sendo escravo, continue escravo e não se preocupe com isto (v. 21). No entanto, como a liberdade é uma forma superior e melhor de vida, ele diz que, se o escravo tem uma oportunidade, legal e cultural, de tornar-se livre, deve aproveitá-la (v. 21). Para Paulo, um cristão tornar-se um escravo de homens, era inaceitável, pois já havia sido comprado por preço (v. 23): deveria permanecer livre. No v. 22, Paulo faz a compensação ao escravo cristão que se mantém como tal: “pois aquele que foi chamado no Senhor, mesmo sendo escravo, é um liberto do Senhor; e assim também o que foi chamado sendo livre escravo é de Cristo”. No Senhor, o escravo não é mais escravo, é um homem livre. A sociedade ainda o acorrenta, mas em Cristo tudo é conforme os mais altos princípios de Deus. Mesmo não rompendo, naquele momento, com a escravidão, Paulo lança uma base que iria fermentar a Igreja e a sociedade em relação a este fenômeno.

                   Outro momento em que Paulo fala mais detidamente sobre o assunto é em sua carta a Filemom. Paulo estava em uma prisão em Roma (v. 9,13). Paulo evangelizou e converteu um escravo fugitivo chamado Onésimo (v. 10). Paulo soube que o senhor de Onésimo era Filemom, outro discípulo que ele havia ganhado para Cristo (v. 19). Escreve uma carta a Filemom para dizer que envia Onésimo de volta, agora como um escravo útil (v. 11). São preciosas as palavras que Paulo usa acerca da forma como Filemom deve receber seu escravo Onésimo

porque bem pode ser que ele se tenha separado de ti por algum tempo, para que o recobrasses para sempre, não já como escravo, antes, mais do que escravo, como irmão amado, particularmente de mim, e quanto mais de ti, tanto na carne como também no Senhor (v. 15,16).


É certo que Paulo não falou contra a escravidão, mas o que ele estava fazendo ao dizer a um senhor de escravos que deveria tratar um escravo fugitivo “não já como escravo, antes, mais do que escravo, como irmão amado” senão destruir toda a base ideológica cultural da escravidão? No entanto, quando apela neste sentido a Filemom, o argumento de Paulo é que Onésimo é agora um “irmão amado”, ou seja, todos eles estão “em Cristo”. “A salvação de Jesus trouxe um nivelamento de todas as pessoas como irmãos (a nova era de Cristo), embora eles continuassem a ser senhor e escravo na sociedade (a velha era), pois”

a fé cristã é para ser vivida dentro dos contextos das estruturas sociais existentes, pois elas pertencem à forma deste mundo, que passará (I Cor. 7.31) [...] Não há nenhuma palavra para libertar o escravo. No entanto, dentro do relacionamento da Igreja, tais distinções sociais foram ultrapassadas (I Cor. 12.13; Gál. 3.28), embora não pudessem ser evitadas na sociedade (LADD, 1985, p. 491).


                   Para quem lê literalmente o Novo Testamento, Paulo é a favor da escravidão e quer que os escravos continuem nesta condição: “foste chamado sendo escravo? Não te dê cuidado” (I Coríntios 7.21); “porque bem pode ser que ele se tenha separado de ti por algum tempo, para que o recobrasses para sempre” (Filemom 15); “vós, servos, obedecei a vossos senhores segundo a carne, com temor e tremor, na sinceridade de vosso coração, como a Cristo” (Efésios 6.5); “vós, servos, obedecei em tudo a vossos senhores segundo a carne” (Colossenses 3.23). Este é o perigo de ler literalmente as Escrituras sem aprofundar-se nos conceitos que ela expressa. Aquele que percebe que Jesus Cristo veio para inaugurar o seu Reino (que é uma nova era onde habita a justiça, o amor, a paz, a misericórdia, a solidariedade, o respeito, a liberdade), e que este se sobrepõe às culturas humanas, perceberá que determinados mandamentos bíblicos estão atrelados a suas épocas e sociedades e devem ser interpretados de acordo com os princípios maiores do Reino. Ridderbos assim se manifesta sobre o tratamento que Paulo dá à escravidão

por certo, fica aparente aqui que Paulo não pensava na abolição da escravatura como instituição por motivos cristãos. [...] Pode-se observar pelo simples fato de Paulo dirigir-se sucessivamente aos escravos e senhores como membros iguais da igreja e descrever o relacionamento entre eles como sendo de responsabilidade mútua, o quanto esta postura significou uma revolução. De maneira alguma ela podia ser conciliada  com a posição do escravo no mundo daquela época e nem dentro do judaísmo. [...] Não se pode negar que, ao mesmo tempo, foi introduzida uma enorme tensão na escravidão como sistema social, mas ainda assim, isso deve ser visto, tanto quanto podemos entender, mais como uma consequência do que como um objetivo deliberado das admoestações de Paulo (RIDDERBOS, 2014, p. 348).


                   A questão da sujeição da mulher nos escritos de Paulo segue a mesma linha do que foi dito acerca da poligamia e da escravidão. Ele segue a ideia básica de que os cristãos (a Igreja) vivem em duas eras ao mesmo tempo: a nova era inaugurada por Cristo, o seu Reino, e a antiga era dominada pelos efeitos da queda no Éden. Em Romanos 5.12-21, ele denomina esta situação entre os que estão “em Cristo” e os que estão “em Adão”. Adão aqui não é apresentado como o homem da criação no Éden, mas aquele através de quem o pecado entrou no mundo e passou esta condição a todos os homens (v. 12). Estar em Adão é ser pecador e estar debaixo dos efeitos da queda. Estar em Cristo é ser constituído justo por ele (v. 19) e reinar em vida por meio dele (v. 17).

                   Em primeiro lugar, Paulo estabelece o princípio de igualdade das mulheres em relação aos homens, decorrente da nova era da salvação. Textos como Gálatas 3.28 e I Coríntios 13, são emblemáticos neste sentido. Da mesma forma como Jesus estabeleceu uma hierarquia de valores colocando o amor e o respeito ao próximo em primeiro lugar (Mateus 22.35-40; 7.12), Paulo mostra os valores do Reino de Deus como importantes para a vivência da Igreja. Ela já vive na salvação de Deus e julga a cultura de acordo com estes padrões. Por conta de também viver na presente era, a Igreja tanto se adaptará à sociedade onde se encontra como também promoverá mudanças dentro dela.

                        A quebra de todas as diferenças sociais em Cristo tem um profundo impacto nesta mesma sociedade. Como já foi dito, os papéis sociais de Gálatas 3.28 continuam os mesmos, mas aconteceu uma mudança interna, tanto nas pessoas que participam desta fé, quanto no grupo que elas passam a integrar dentro da sociedade, que é a Igreja cristã. A fé em Jesus vai dizer que judeus e gentios são iguais neste Reino que pertence ao Senhor. Vai dizer que, em Cristo, todos são livres, embora temporalmente, alguns continuem escravos. Vai dizer que, embora continuem com a sexualidade que a natureza lhes deu, são agora iguais e não há mais superioridade de uns em relação a outras. Com o crescimento da Igreja cristã e sua influência, chegou o tempo em que as próprias sociedades humanas se apegariam aos princípios advindos desta doutrina e fariam uma declaração universal dos direitos humanos, aboliriam a escravatura, instituiriam o voto universal e a democracia, nivelariam a mulher ao homem com todos os direitos inerentes, e muito mais. Não é à toa que todas estas conquistas se deram em países de tradição cristã. O princípio de Paulo diz respeito à Igreja, mas sem dúvida seria um avanço também para as sociedades por ela influenciadas. Esta visão de Paulo mudaria as sociedades. A grande tragédia para o cristianismo é que sua Igreja, na prática, aceitaria as implicações destes princípios de Paulo depois da sociedade, como foi o caso da escravidão e agora, da igualdade de homens e mulheres.

                   Em segundo lugar, Paulo respeita as culturas onde os cristãos estão inseridos. A cultura da época paulina é patriarcal. O marido/pai tinha todo o poder dentro da família, pois “as relações familiares eram de dominação pelo chefe da casa e de sujeição por parte da esposa, dos filhos e escravos e isso constituía a célula fundamental da construção do Estado, uma estrutura que se refletia nas classes e no status social” (MATOS, 2004, p. 79). Quando fala em I Coríntios 14 e em I Timóteo 2, acerca das reuniões da igreja, qual não seria a vergonha, dentro de uma sociedade deste tipo, que as mulheres não trariam para a igreja e seus maridos se começassem a exercer autoridade sobre os homens e tomassem a liderança em todas as reuniões. A igreja seria imediatamente mal vista por toda a sociedade e isto poderia implicar em perseguição contra ela por parte da sociedade e do Estado. A abertura que Paulo tem em mente é o não impedimento, por conta de desrespeitos à cultura do lugar, da salvação de todos conforme I Coríntios 10.32-33,

não vos torneis causa de tropeço nem a judeus, nem a gregos, nem a igreja de Deus; assim como também eu em tudo procuro agradar a todos, não buscando o meu próprio proveito, mas o de muitos, para que sejam salvos.


Não tornar causa de tropeço significa não afrontar os costumes que a sociedade da época pratica. Como o hábito da submissão da mulher era generalizado em todo o Império Romano, essa era uma regra que deveria ser seguida. Por esta razão, Paulo não consentia que a mulher doutrinasse na igreja ou exercesse autoridade sobre os homens e dizia que ficassem caladas na igreja. Por este pretexto também, ele diz que os bispos devem ser maridos de uma só mulher e “que governe bem a sua própria casa, tendo seus filhos em sujeição, com todo o respeito” (I Timóteo 3.2,4). Na compreensão paulina, a Igreja ainda está nesta velha era, e participa da situação humana decorrente da queda.

                   No entanto, todas as vezes em que Paulo subordina a mulher ao homem por questão cultural, ele compensa ensinando os princípios da nova era em Cristo. No texto de I Coríntios 11, acerca do véu das mulheres, ele insere os v. 11,12. Ele começa o v. 11 dizendo: “no Senhor”, a indicar que antes estava falando da questão cultural local, mas agora fala da nova era. Sua alegação é que homens e mulheres não são autônomos e ambos vêm de Deus. Em I Coríntios 14.34,35, as mulheres devem ficar caladas na igreja não podendo ensinar, mas podem profetizar e orar (11.5; 14.29-31). Em I Timóteo 2.9-15, onde a mulher não pode ensinar e nem exercer autoridade sobre homem, ele insere o v. 15 que diz respeito à “salvação” da mulher, ou seja, acerca da nova era em Cristo e que a faz ser protagonista no Reino de Deus. Até mesmo no texto acerca da família (Efésios 5.22-33), onde Paulo advoga claramente a liderança masculina, há compensações às mulheres. Se elas devem submissão aos maridos (v. 22), eles devem amá-las como Cristo amou a Igreja, ou seja, a ponto de se auto sacrificar em favor dela. Os maridos devem ter  igual cuidado por elas como os seus próprios corpos (v. 28,29) por qual motivo? “Porque somos membros do seu corpo” (v. 30). Paulo apresenta estas compensações em relação à mulher e diz que a relação marido/mulher deve ser diferente daquele que é o costume usual praticado pela sua sociedade simplesmente porque fazemos parte do Corpo de Cristo, a Igreja. É no âmbito da nova era do Senhor que os comportamentos culturais vão sendo mudados.

                   Outra advertência é que Paulo, sempre que não houvesse “pedra de tropeço”, procurava, na prática da vida, equipararem-se homens e mulheres. Em Romanos 16, quando saúda muitos irmãos que estão em Roma, ele fala de várias mulheres que trabalharam tanto quanto os homens no Reino de Deus e algumas em posição de liderança. Temos Febe (v. 1,2) que é diaconisa (grego: diáconos) e patrona, líder (grego: prostatis, v. 2),


Febe é também a única em Romanos 16 a quem a palavra prostatis é empregada. Prostatis é a forma feminina de um substantivo que significa “líder, pessoa que preside, que fica à frente, patrono”. Este substantivo provém da raiz verbal proistemi, que significa “governar e cuidar” como vemos em quatro passagens (I Timóteo 3.4,5,12; 5.17) (MICKELSEN, 1996, p. 231-232).


Achamos o casal Priscila e Áquila (v. 3) que ele qualifica de “meus cooperadores” (interessante é o fato de Paulo citar a mulher antes do marido, incomum para a época). Maria (v. 6) “muito trabalhou por vós”. No v. 12: “saudai a Trifena e a Trifosa, que trabalham no Senhor. Saudai a amada Pérside, que muito trabalhou no Senhor”. No v. 7, ele diz: “saudai a Andrônico e a Júnias, meus parentes e meus companheiros de prisão, os quais são bem conceituados entre os apóstolos, e que estavam em Cristo antes de mim”. Andrônico e Júnias são chamados de “apóstolos”. Há uma grande discussão se “Júnia” é um nome feminino ou masculino (ver para nome feminino: MICKELSEN, 1996, p. 232-233; SILVA, 2013, p. 139; autores que manifestam incerteza: BRUCE, 1979, p. 219; LOPES, 2015, p. 4). Segundo Silva, “vale ressaltar que 9 mulheres são mencionadas ao lado de 17 homens na lista de saudação de Romanos 16.1-16 volume numérica admirável para o contexto das afinidades patriarcais” (2013, p. 139). Richardson (apud MICKELSEN, 1996, p. 233) afirma: “o que esta relação demonstra é que num simples ambiente (Rm 16), numa lista coerente de saudações, as mulheres recebem mais honrarias do que os homens, a despeito do número destes ser superior e a elas se atribuem papéis mais influentes!”. Em Filipenses 4.2,3, Paulo cita Evódia e Síntique e diz que “trabalharam comigo no evangelho”. Em I Timóteo 3.8-13 ao falar acerca dos diáconos, Paulo diz no v. 11: “da mesma sorte as mulheres sejam sérias, não maldizentes, temperantes e fiéis em tudo”. As mulheres eram diaconisas na Igreja Primitiva, posição de destaque e liderança, mesmo num mundo patriarcal.



3.3 A POSSIBILIDADE PAULINA DA MULHER PASTORA FEMININO



                   Quando se trata especificamente da mulher assumir o pastoreio de uma igreja nos tempos atuais, a que conclusões chegamos dos escritos de Paulo? Será possível retirar princípios que, aplicados ao tempo e à cultura atual, admitam o exercício do ministério pastoral feminino? Teólogos discordam acerca desta possibilidade no ensino de Paulo.

                   Lopes, comentando os textos de Coríntios e Timóteo, manifesta-se contrário, argumentando que,

O princípio por detrás desta ordem (mulheres usarem o véu), conforme vimos acima, é o de apresentarem no culto em plena submissão à liderança masculina cristã. O uso do véu é a forma contextualizada pelo qual esse princípio se expressava. Hoje em dia, nas culturas ocidentais, o uso do véu não é uma expressão apropriada deste princípio. O princípio permanente que está subjacente em 1 Coríntios 11.2-16, 14.34-35 e 1 Tm 2.11,12 é o de que se mantenham as distinções e os papéis intrínsecos ao homem e à mulher na igreja e na família. Assim, a mulher não deve inverter os papéis, e ocupar posição de autoridade sobre os homens, quer seja para governá-los ou para ensiná-los. (2015, p. 20-21) (grifos do autor).


Grudem também se manifesta contrário a essa possibilidade

essas (ensino e exercício de autoridade) eram as funções dos presbíteros da igreja e especialmente dos que conhecemos como pastor na igreja atual. São especificamente estas funções singulares de um presbítero que Paulo proíbe que as mulheres exerçam na igreja (1999, p. 787).

Foh também se posiciona contrariamente: “com respeito aos cargos da igreja, as mulheres não podem ser presbíteras (nem pastoras-mestras, nem evangelistas, nem ministras, como às vezes são designadas), porque esses cargos envolvem o ensino e o governo” (1996, p. 122).

                   Por outro lado, Mickelsen mostra-se favorável, pois

homens e mulheres cristãos não devem enredar-se e prender-se sob um jugo escravizador. Homens e mulheres devem pregar. Mulheres e homens devem fazer discípulos. Devem ministrar com os dons do Espírito. Cristo libertou homens e mulheres para que sirvam, amem, fortaleçam e apoiem as pessoas e delas cuidem. [...] O ensino de Gênesis, a vida e os ensinos de Jesus, o escopo e dos escritos e da prática de Paulo – tudo isso aponta para a completa dignidade das mulheres que têm sido chamadas e dotadas de talentos pelo próprio Deus, a fim de que sirvam à igreja e ao mundo (1996, p. 250) (grifo do autor).


Liefeld aponta para princípios, extraídos dos textos de Paulo, que permitem, hoje em dia, aceitar a liderança da mulher na igreja

Paulo tinha um princípio básico que requeria a subordinação temporária dos demais princípios. Em Gálatas, Paulo estabeleceu o princípio de que o crente está “morto” para a lei. A salvação não é obtida mediante fazerem-se as obras da lei do Antigo Testamento. Paulo permanece em sua autoridade de apóstolo. Como vimos, ele também instituiu um princípio relativo ao homem e à mulher em Cristo. Mas em I Coríntios, Paulo diz que ele, o apóstolo da liberdade da lei, está disposto a tornar-se “como sob a lei” a fim de ganhar os que estão sob a lei. O fato de assumir esta notável posição como que para remover as barreiras do evangelho, sem mudar sua posição sobre a salvação, à parte das obras da lei, deveria alertar-nos para a realidade de que ele também pode acomodar as normas sociais dos judeus e outras, concernentes às atividades públicas das mulheres, sem mudar sua posição, que é a da igualdade entre homens e mulheres. Se algumas pessoas do período de Paulo pensavam ser vergonhoso que a mulher falasse em público, ou aparecesse em público sem um véu facial, ou usasse o cabelo solto caindo sobre os ombros, quais são as implicações do fato de que, em nossos dias, e em nossa sociedade, é vergonhoso restringir as mulheres, tirando-lhes a igualdade com os homens, e a total oportunidade de expressão?  (1996, p. 172-173).


Ladd, discutindo a aplicação da ética social de Paulo, conclui

a situação cultural e a estrutura da Igreja são bem diferentes do cristianismo do primeiro século, e o crente moderno não pode aplicar os ensinamentos da Escritura num relacionamento de igual para igual, mas deve buscar a verdade básica que subjaz às formulações particulares em o Novo Testamento (1985, p. 489).

                  

                   Os tempos passaram-se e as culturas e sociedades se transtornaram. O Ocidente sofreu alterações nestes 21 séculos que o apartam do Novo Testamento. Nas três questões éticas debatidas, o Ocidente firmou a monogamia, suprimiu a escravidão e deu plenos direitos às mulheres ao ponto de algumas delas virarem dirigentes de Estado. Todos estes avanços sociais foram conquistados exatamente pela tradição cristã de suas sociedades. Estes progressos não aconteceram nos países de tradição muçulmana, hinduísta, budista e de outras religiões. Se alguns países destas tradições adotaram estes avanços foi por conta da influência do Ocidente. É neste novo contexto que se deve entender os ensinos de Paulo e de toda a Bíblia acerca do ministério pastoral feminino.

Precisamos entender que nos dias de Paulo o fato de uma mulher falar em público e ensinar na igreja constituía um problema moral que trazia vergonha à igreja e ao Senhor, impedindo as pessoas de virem a Cristo. Mas isto não constitui um problema na maior parte das sociedades de hoje, pelo menos no mundo ocidental. Na verdade, a situação sofreu uma reversão: proibir uma mulher de ter a mesma dignidade e oportunidade na Igreja de que ela desfruta na sociedade constitui uma pedra de tropeço para muitas pessoas. Portanto, ao tentar honestamente fazer a mesma aplicação (o silêncio das mulheres) em vez de seguir o mesmo princípio (evitar a vergonha e a desonra sobre o marido), cometemos hoje o mesmo erro que Paulo procurou evitar, isto é, ofender as sensibilidades morais das pessoas e impedi-las de aceitar o Evangelho (LIEFELD, 1996, p. 170-171).


As exceções bíblicas que evitavam a mulher de ser pastora no período do Novo Testamento findaram-se com a transformação das culturas das sociedades. As exceções paulinas estavam ligadas exatamente à cultura das sociedades onde ele vivia. Paulo, embora flexível aos costumes culturais de sua época para não “por tropeço” à pregação do evangelho, sabia que, em Cristo, a nova era de Deus havia se iniciado e invadira a velha era de Adão. Em seus ensinos e na sua prática de vida, igualou homens e mulheres no Reino de Deus. Atualmente, quando as práticas culturais foram mudadas e as mulheres assumiram seus direitos de igualdade com os homens, caíram por terra as exceções paulinas para o ministério pastoral feminino, mas permanecerão, para sempre, os princípios do Reino de Deus, a nova era de Cristo, pelo qual ele sempre lutou: “não há judeu nem grego; não há escravo nem livre; não há homem nem mulher; porque todos vós sois um em Cristo Jesus”. Esta nova era de Cristo, embora aqui e agora tenha invadido a presente era má, não chegou à sua consumação. Perto de sua morte, ao escrever sua segunda carta ao pastor Timóteo, ele assim se expressa sobre esta consumação e sobre a existência aqui e agora: “e o Senhor me livrará de toda má obra, e me levará salvo para o seu reino celestial; a quem seja glória para todo o sempre. Amém. Saúda a Priscila e a Áquila e à casa de Onesíforo” (II Timóteo 4.18,19).





4    CONSIDERAÇÕES FINAIS



A inquirição nos escritos e teologia do apóstolo Paulo aborda da probabilidade do ministério pastoral feminino abalizou aberturas para desvendar seu pensamento.

Há três textos relevantes nos escritos paulinos: Gálatas 3.26-29, I Coríntios 11-14 e I Timóteo 2.8-15. No primeiro texto (Gl. 3.26-29), Paulo expressa um princípio bíblico extremamente importante que ultrapassa a área da soteriologia: “em Cristo Jesus, não há homem nem mulher”. Este é um princípio que, pelo seu valor, regerá as demais orientações. Nos outros textos (I Co 11-14 e I Tm 2.8-15), ele restringe a atuação das mulheres na igreja, em especial na área da liderança pastoral. Ele assim o faz com base no respeito à cultura da época que era fortemente patriarcal. Mas, mesmo nestes textos, ele compensa a situação subordinada da mulher, lembrando acerca dos princípios e posição dos que estão “em Cristo”.

A teologia paulina fala de duas eras: a atual que procede da queda de Adão e onde todos estão e a nova era que foi inaugurada por Cristo com sua morte e ressurreição. Esta nova era também chamada Reino de Deus, escatologicamente invadiu a história e formou um povo: a Igreja, comunidade dos que creem em Jesus Cristo. Ocorre que a Igreja vive em duas eras ao mesmo tempo e deve conciliar estas vivências. Viver na nova era de Cristo significa alcançar os princípios desta nova vida, que é a de Deus. Viver na era antiga significa discernir, dentro de cada sociedade e cultura, o que é bom e o que é mal. Este discernimento leva a Igreja a conformar-se com os costumes locais e temporais, mas com o firme propósito de modificá-los sempre de acordo com os princípios superiores da nova era em Cristo. Três costumes da época de Paulo são apresentados: a poligamia, a escravidão e a subordinação da mulher na sociedade e na Igreja. Para cada um desses problemas, Paulo pode conviver, pois são costumes sociais da presente era. Ele faz isto com o firme propósito de não colocar “pedras de tropeço” na Igreja a fim de que o evangelho possa ser pregado sem restrição e mais pessoas sejam salvas. Mas, ao mesmo tempo, sua orientação provocará uma erosão das bases filosóficas e ideológicas que sustentam estes costumes.

Por fim, os princípios superiores da teologia paulina levam ao entendimento de que a mudança da cultura da sociedade leva a uma nova postura da Igreja. Se, no primeiro século, era vergonhoso para a mulher falar em público e liderar homens, tal vergonha não existe mais. Pelo contrário, hoje é vergonhoso proibir a mulher de fazer tais coisas. Continuam de pé os princípios paulinos de que não devemos colocar “pedras de tropeço culturais” para que as pessoas venham a Cristo e que nele “não há homem, nem mulher”. 


Mais uma objeção frequente a esta interpretação sobre mulheres no ministério é em relação às mulheres que ocupavam posições de liderança na Bíblia, principalmente Miriã, Débora e Hulda no Antigo Testamento. Esta objeção falha em perceber alguns fatores relevantes. Primeira Débora foi à única juíza entre 13 juízes homens. Hulda foi à única profetisa mulher entre dúzias de profetas homens mencionadas na Bíblia. Miriã era irmã do profeta de Deus, com a liderança e era por ser irmã de Moisés e Arão. As duas mulheres mais importantes do tempo dos reis foram Atalia e Jezabel – péssimos modelos de boa liderança feminina.


 Constituiria com base nesta personalidade que vieram a introduzir no Novo Testamento? Mais ainda, porém, a autoridade das mulheres no Antigo Testamento não é relevante para a questão, nenhuma mulher constituiu sacerdotisa em Israel, ainda que as filhas de Jetro e Débora e outras eram pastoras de ovelhas isso não significa que ovelha fosse o povo de Deus, então o sacerdote era o cuidador do povo de Deus e não de animais que não tinham almas nem espirito, Gn 29.9 fala de Rute como pastora de ovelha. O livro de 1 Timóteo e as Epístolas Pastorais apresentam um novo paradigma para a igreja  o corpo de Cristo e esse paradigma envolve a forma relevante de autoridade para a igreja, não para a nação de Israel ou de qualquer outra entidade do Antigo Testamento. 

 

 Autor do artigo: Valdeci Fidelis.

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