A Cúpula 100% masculina da Igreja Presbiteriana proíbe pregação feminina. Mulheres divulgam carta em repúdio às decisões da IPB que as alijam de espaços de poder 23.ago.2022 às 4h15. Atualizado 23.ago.2022 às 18h31Anna Virginia Balloussier Cézar Feitoza SÃO PAULO E BRASÍLIA.
Um grupo de mulheres da Igreja Presbiteriana do Brasil, a IPB, achou que 2022 seria o ano de curar retrocessos. Elas se viram, contudo, ainda mais alijadas da liderança da igreja, após uma série de proibições impostas pela cúpula 100% masculina da instituição. Desde julho, elas não podem mais pregar em cultos solenes e distribuir a Santa Ceia. Maioria nos templos, elas até então exerciam sem grandes problemas essas atividades. Mas nunca puderam ser ordenadas pastoras, presbíteras e diaconisas, os três cargos oficiais da IPB.
Em 2018, tentaram viabilizar pelo menos o diaconato feminino assim, teriam aval para fazer trabalhos básicos nos templos, como prestar assistência social e coletar ofertas. Mulheres da Igreja Presbiteriana do Brasil fazem reunião sobre decisões internas que consideram machistas. Reprodução há quatro anos, veio a primeira bomba. O Supremo Concílio decidiu que mulheres só podiam subir nos púlpitos para pregar o que elas às vezes faziam, mesmo sem título pastoral se estivessem sob supervisão de algum homem. O órgão funciona como assembleia-geral da IPB e tem 1.400 membros mais uma mesa diretora liderada desde 2002 pelo reverendo Roberto Brasileiro.
Um contingente, diga-se, todo masculino, que de quatro em quatro anos se reúne para promover eleições internas e deliberar sobre temas sensíveis à igreja. A segunda bomba teve impacto nuclear sobre a ala feminina que esperava a revogação da norma que limitava sua participação na IPB. Em vez disso, o Supremo Concílio determinou interdições ainda mais severas em seu último encontro quadrienal, em julho. O sacerdócio universal não implica que todos os crentes servirão ao Senhor e à sua igreja em todas as áreas, dizem os cabeças da IPB em documento para embasar a decisão, ao qual a Folha teve acesso. Há uma citação ao apóstolo Paulo no Novo Testamento Porventura, são todos apóstolos? são todos profetas? são todos mestres?
Supremo Concílio em mensagens de WhatsApp.
A reportagem também viu o print de um grupo de pastores da igreja, com lamentos ao conteúdo divulgado pelas mulheres. Um reverendo diz que, "vencida a matéria sobre os partidos de esquerda, só lhes resta a causa do 'suposto' machismo estrutural".
A mensagem faz menção a um relatório que sugeria repudiar "o pensamento de esquerda", mas que acabou barrado pela cúpula da igreja em julho. Diagnosticou-se, então, que a proposta, se levada a cabo, poderia causar um cisma similar ao que ocorreu na ditadura quando alguns pastores, insatisfeitos com o apoio ao regime militar, romperam com a IPB e fundaram uma igreja dissidente.
O reverendo Ageu Magalhães, voz conservadora na estrutura, fez sua crítica publicamente, por meio de uma rede social. Ele se levanta contra uma carta "espúria" que, no seu entender, não pode ter sido redigida por mulheres que se dizem presbiterianas. As verdadeiras fiéis "nunca quiseram ser pastoras ou pregadoras" e são "piedosas e submissas às resoluções do Supremo Concílio", argumenta. O que ele leu "é um manifesto de rebeldia" inadmissível.
A exclusão das mulheres de atividades-chave tem potencial para provocar um racha ainda maior do que o dos tempos militares, disseram à Folha pastores próximos a Roberto Brasileiro, o presidente do Concílio. Eles entendem que a questão dos "cristãos de esquerda", muito alardeada pela imprensa, foi solucionada, enquanto das mulheres ainda gera muito ruído com o chão da igreja.
Mulheres com certeza não, ao menos na leitura que o conselho faz da Bíblia. O texto oficial que diz que "nem o ensino nem o exercício de autoridade masculina são permitidos à mulher". As missionárias que exercem essas funções devem ser "pastoreadas e instruídas com paciência e no espírito do amor cristão quanto ao ensino bíblico sobre o assunto", afirma.
"Ao se designarem as irmãs para servirem os elementos, corre-se o risco de se estabelecer paulatinamente um modelo antibíblico de liderança", diz um segundo relatório, que veta a participação delas na partilha da Santa Ceia.
Há patente preocupação, da parte dos líderes presbiterianos, em não ceder à "secularização ao redor do mundo". É preciso, segundo o documento, alertar pares de fé "para o avanço das novas mentalidades identitárias seculares e de sua respectiva agenda, na qual o tema do lugar da mulher se torna cada vez mais recorrente".
Circula no meio presbiteriano uma carta em contrarreação, com mais de mil signatárias (e o endosso de quase 300 homens solidários a elas). O texto repudia "a violência simbólica que nos foi imposta no último Supremo Concílio", esculpida a partir de "interpretações machistas". Um protesto para questionar como que, ao reclamar mais espaço para mulheres nas instâncias de poder da igreja, as fiéis vieram escorrer pelo ralo direitos que já possuíam.
A Folha conversou com algumas das mulheres que subscreveram a carta. Elas deram a entrevista, mas depois pediram anonimato, com medo de represálias internas. O manifesto das protestantes fala de um "movimento violento, iníquo e persecutório insistindo em ‘convidar-nos’ à retirada, para outras denominações cristãs". Elas se recusam.
Não que todas as cristãs concordem em discordar da liderança. Uma integrante da Confederação das Sociedades Auxiliadoras Femininas, que dá suporte à IPB, disse compactuar com a posição.
A reportagem também viu o print de um grupo de pastores da igreja, com lamentos ao conteúdo divulgado pelas mulheres. Um reverendo diz que, "vencida a matéria sobre os partidos de esquerda, só lhes resta a causa do 'suposto' machismo estrutural".
A mensagem faz menção a um relatório que sugeria repudiar "o pensamento de esquerda", mas que acabou barrado pela cúpula da igreja em julho. Diagnosticou-se, então, que a proposta, se levada a cabo, poderia causar um cisma similar ao que ocorreu na ditadura quando alguns pastores, insatisfeitos com o apoio ao regime militar, romperam com a IPB e fundaram uma igreja dissidente.
O reverendo Ageu Magalhães, voz conservadora na estrutura, fez sua crítica publicamente, por meio de uma rede social. Ele se levanta contra uma carta "espúria" que, no seu entender, não pode ter sido redigida por mulheres que se dizem presbiterianas. As verdadeiras fiéis "nunca quiseram ser pastoras ou pregadoras" e são "piedosas e submissas às resoluções do Supremo Concílio", argumenta. O que ele leu "é um manifesto de rebeldia" inadmissível.
OBSERVARAM QUE: (nota do editor)
A exclusão das mulheres de atividades-chave tem potencial para provocar um racha ainda maior do que o dos tempos militares, disseram à Folha pastores próximos a Roberto Brasileiro, o presidente do Concílio. Eles entendem que a questão dos "cristãos de esquerda", muito alardeada pela imprensa, foi solucionada, enquanto das mulheres ainda gera muito ruído com o chão da igreja.
O jornal procurou a IPB para ouvir seu posicionamento sobre o assunto, mas não recebeu resposta. No último dia 12, em culto de aniversário de 163 anos da IPB, Brasileiro passeou pelo tema.
"Reafirmamos o belo papel que a mulher exerce na vida da nossa igreja", discursou.
"Depois, cada irmã poderá examinar os documentos com muita alegria e paixão. Irão descobrir que a nossa igreja deu um valor muito especial para a mulher. Colocou-a, de fato, naquilo que é o mais sublime dos mais sublimes lugares, para o qual Deus a criou: auxiliadora idônea em todas as suas tarefas, todos os seus ministérios e em todo o seu papel."
A crise deflagrada pela reação feminina aos líderes foi motivo de troça em círculos menos conservadores dos presbiterianos. Eles resgatam uma crise ainda mais antiga, do século 19, envolvendo a IPB e maçons. Agora o que periga dividir a igreja não é a maçonaria, brincam. É a "machonaria" mesmo.
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